10 de junho de 2012

Dia de Portugal, dia de Camões

Caros leitores e leitoras, hoje festeja-se o dia de Portugal e dia da morte de Camões.

Ao que parece, foi ali para os lados da Calçada de Santana, em pleno coração de Lisboa e nas costas do Hospital São José que o homem entregou a alma à musa.

Temos dado o nosso melhor aqui no blog em promover e defender a cultura portuguesa. Fazemo-lo por considerarmos que a elite política, desde o 25 de Abril de 1974, tem sistematicamente valorizado os méritos da cultura europeia e da nossa necessidade em nos aproximarmos dos seus padrões de desenvolvimento, esquecendo o que somos e se é possível caminhar para lá.

Presumimos que, ou por não saberem, ou por se terem esquecido de informar, essa aproximação à Europa trazia custos escondidos. E que custos eram esses?

Exigir ao povo que transformasse aspetos essenciais da sua cultura num espaço de 2 décadas, ou seja, deixar de SER umas coisas para passar a SER outras.

Talvez tenha sido uma certa soberba, aliada a uma ignorância mascarada de erudição estrangeirada que deu aos políticos esta certeza de que a mega manipulação que estavam prestes a empreender seria a política correta para um Portugal moderno e europeu.

É verdade que sempre vimos os países do Norte da Europa como um modelo de desenvolvimento a seguir. Numa biografia que lemos há uns tempos sobre Afonso Costa, proeminente político do início da 1ª República, as viagens de comboio entre o Rossio e Paris eram o veículo das novas ideias que brotavam por essa Europa fora.
E esse fascínio ainda subsiste na população. A opinião pública portuguesa continua a clamar por mais Europa; juntarmo-nos ainda mais aos mais fortes.
E se repararem, esta integração europeia seria a consumação do nosso amor platónico pela bela, organizada e rica Europa. É um comportamento típico de povos com uma certa falta de auto-estima.

Perguntas que achamos pertinentes fazer a qualquer político europeísta:

Quão diferente são estas culturas do Norte e do Sul?
Será esta distância cultural possível de suprir de todo? E se sim, como será feito?
E sendo possível, quanto tempo pode demorar?
E quanto custa?

Avançar para políticas de uma integração entre povos desta dimensão exigiria respostas minimamente convincentes e estudos que consubstanciassem esta vontade.

E eis a pergunta mais "desagradável" de todas:

Será possível a um povo como o português mudar em tão curto espaço de tempo?
Sinceramente não acreditamos, e essencialmente por 2 razões:

1ª Somos demasiado libertinos, inteligentes e conspiradores para confiar cegamente nos ideais de uma minoria política, e logo, naturalmente relutantes em mudar comportamentos. Se for para vivermos da riqueza de terceiros e não trabalharmos, isso não nos custa nada, mas se for para sermos mais organizados, mais produtivos, mais obedientes, e só depois mais ricos, aí o caso já muda de figura.

2ª Para "estimular" esta mudança cultural, a Europa desenvolveu um conjunto de mecanismos de transferência de riqueza que se suporia serem o catalisador da mudança e da modernidade. Está ainda por provar a eficácia desta política de redistribuição. A performance da economia portuguesa nos últimos 30 anos e o endividamento gerado diz-nos que os efeitos desta redistribuição não são nada satisfatórios. A política adotada não entranhou na cultura portuguesa e foi antes esta que se aproveitou das falhas em seu direto benefício: Viver bem à sombra do subsídio é um dos muitos comportamentos que se geraram. A manipulação e as permanentes escaramuças no plano político/partidário só ajudaram a adensar esta relutância.

Não temos nada contra as culturas do norte da Europa, antes pelo contrário. Valorizamos e muito a necessidade de contas equilibradas, produtividade e organização, comportamentos típicos do norte da Europa.

Mas também temos de aprender com a nossa história e perceber que se o nosso caminho como Nação seria a integração europeia, tal fenómeno já teria ocorrido há muitos séculos. Não ocorreu e até nos fomos progressivamente distanciando. Os Descobrimentos, o comércio ultramarino e a miscigenação com tantas culturas diferentes por esse planeta fora até tão tarde revelam bem esse distanciamento. A história dos outros povos europeus ao longo dos séculos é de escaramuças constantes entre si e se repararem, a colonização destes começa MUITO mais tarde do que a nossa, acabando mais cedo e de formas muito mais violentas. Aliás, foi esse ódio entre colonizados mal tratados e colonizadores europeus prepotentes, sendo o Congo Belga um belo exemplo, que resultou nesta vontade de independência destes povos. Não os censuramos porque qualquer pessoa gostaria de se ver livre daquele jugo. Angola e as restantes colónias foram, por arrasto, fatalmente contaminadas.

Estes são factos históricos que não discutimos, apenas nos baseamos neles para formar uma opinião tão realista quanto possível. Se a história nos dissesse outra coisa, a nossa opinião também seria outra.

Temos a consciência de que no curto prazo a ideologia vigente continuará a ser mais Europa e mais integração. É nossa esperança que as evidências negativas se vão amontoando, e lá mais para a frente nos possamos aperceber que o namoro é demasiado desvantajoso para nós, ao ponto de por em causa a nossa própria essência como povo e cultura.

Estamos confiantes de que essa consciência coletiva irá emergir antes de se dar o rompimento e o desastre total, porque, mais uma vez, a nossa história diz-nos que em muitas ocasiões soubemos ir aguentando a presença de uma força externa/ameaça até ao momento em que, como Nação, percebemos que seria mais vantajoso mudar do que manter. Acreditamos que tenha sido assim com a Restauração em 1640, todo o processo das invasões francesas, a independência do Brasil, as lutas liberais, o fim da 1ª República, o fim da ditadura e outras.

Por nós, o namoro acabava já hoje, como sabem. Mas quer dizer, ainda só temos 26 anos de namoro com esta "gaja boa", mas com uma cabeça muito complicada, que se chama Europa. Calma!

Tiago Mestre

4 comentários:

Anónimo disse...

Não se pense que este "dolce far niente" que deram aos países periféricos (PIIGS) foi gratuito... a estratégia era passar de "colonizadores" a "colonizados"... daí os subsídios para nos adormecer e tornar "mais fracos", simplesmente. Sem dúvida que eles são bastantes racionais, organizados e produtivos. Mais que fez os "Descobrimentos" fomos nós, quem aculturou meio mundo fomos nós. A língua de Camões está no top Ten das mais faladas pelo mundo ("204" nações).
Continuo a professar que o nosso verdadeiro problema é a corrupção, transversal a toda a sociedade. Existirá sempre... devia era ser consideralvelmente mitigada para não dizer expurgada.
Grato pelas Vossas reflexões, partilha de informação e blogue distinto.
Com os meus respeitosos cumprimentos,
JB

Anónimo disse...

Frase da filósofa russo-americana Ayn Rand (judia, fugitiva da revolução russa, que chegou aos Estados Unidos na metade da década de 1920):

"Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto sacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada".
Isto é universal.. Não diria melhor :)
Abraço,
JB

Tiago Mestre disse...

JB, sobre a corrupção, eis a minha opinião genérica:

Corrupção é um crime que envolve 2 ou mais entidades que, combinadas entre si, lesam uma terceira parte. Normalmente é o Estado o lesado. Pode ser também um fornecedor que é obrigado a cometer ilícito para conseguir ter adjudicações por parte do cliente, que normalmente tb é Estado. Ou seja,
NUNCA se conseguirá reduzir a corrupção para valores socialmente aceitáveis (porque ela existitrá sempre) querendo usar apenas a justiça e os tribunais. A corrupção precisa quase sempre de uma confissão porque se o trabalho for bem feito entre corrupto e corruptor, é impossível provar que houve ilícito. É por isso que há tão poucas condenações.
A lei do enriquecimento ilícito é uma tentativa grosseira de querer contornar estes obstáculos naturais, mas tb esta irá falhar..

Só vejo uma solução: reduzir substancialmente o volume de transações entre Estado e privados. E como? Reduzindo a presença do Estado da Economia. E como? Reduzindo a sua despesa de 80 para 50 mil milhões, que aliás será uma fatalidade por colapso da própria economia e da falta de impostos. Um Estado gordo (50% da economia) é que é verdadeiro problema, porque transformou-se numa mega máquina abstrata (sem rosto) de redistribuição de riqueza. Coração que não vê, coração que não sente: é este o cenário perfeito para a corrupção.
A redução da despesa também iria acarretar a redução de impostos, e menos impostos significa mais incentivo a que mais gente pague o que deve ao Estado, moralizando os comportamentos e tornando menos apetecível a fuga, que é também em muitos casos um ato de corrupção, sobretudo quando há esquemas, como foi o caso do carrossel do IVA, off-shores, branqueamentos de capital e outros.

Se as transações privadas em Portugal forem sobretudo entre 2 entidades puramente privadas, a tal entidade abstrata já não existe (a não ser que seja uma empresa muito grande), logo a corrupção afigura-se muito mais difícil. (dificilmente um patrão se quer enganar a ele próprio, a não ser que seja "burro")

Se a solução estivesse na justiça já teria sido implementada. Mas aceito a ideia que um reforço de meios de investigação não era dinheiro perdido.

Anónimo disse...

Se o Tribunal de Contas tivesse poder sancionatório real e mais auditores. Se fosse independente. Se o visto prévio fosse obrigatório para tudo o que envolve dinheiros públicos superior a um montante acumulado de gasto público (por gestor público). Se houvessem mais auditores do TC (são mesmo muito poucos). Se a PJ tivesse muitos mais inspectores especializados no crime financeiro (e os deixassem trabalhar). Se quem regula, regulasse mesmo (um estado eminentemente regulador "vê a banda passar"... como se pode ver no caso dos bancos BPN e afins / comunicações / media / energia)...
Se rolassem cabeças (já para não falar em execuções) para quem gere dinheiros públicos. Se houvesse um período de nojo de 10 anos para quem exerceu cargos públicos e ingressa em lugares estratégicos em empresas privadas/multinacionais/bancos (e vende sem peso de consciência as informações vitais do Estado).
São muitos "ses". Daí que concordo consigo.
Bem haja.