4 de junho de 2012

Cuidado com as empresas públicas (Parte 2)

Referente ao comentário do Filipe Silva no post anterior, também gostaríamos de dizer algumas coisas:

Concordamos em pleno que a crise só chegou a Lisboa já depois de ter chegado a todo o lado, excepto talvez ao Arquipélago da Madeira!
Lisboa e os seus residentes viveram de dinheiro emprestado e mantiveram o seu nível de vida durante décadas dessa forma. Inclusivamente criou-se um certo desdém dos lisboetas para com o resto do país, consubstanciando aquela célebre frase das invasões francesas de que "Portugal é Lisboa e o resto é paisagem".

Os lisboetas não se aperceberam que afinal era Portugal que produzia para manter o centro do poder (Lisboa) de barriga bem cheia e sempre pronta a embarcar em golpes, revoluções, contra-golpes, e já mais tarde em democracia, nesta atitude meio ignorante, meio soberba de que Lisboa é que manda e onde tudo acontece.

Mas só conhecendo o país, sobretudo o Norte, e um pouco de economia, é que se percebe de onde é que a riqueza produtiva vem.

No que toca a gastos públicos, infelizmente já não concordamos com o Filipe. Os políticos das autarquias e das regiões foram infetados com o mesmo vírus do despesismo público centralizado lisboeta de forma mais ou menos generalizada, independentemente da zona do país. Há autarquias e empresas públicas boas e más espalhadas um pouco por todo o país sem haver um padrão definido de que ali são mais disciplinados e acolá menos. Mas concordamos que há um maior ímpeto para gastar das autarquias e das empresas públicas que rondam a cidade de Lisboa face ao resto do país, talvez pela proximidade com o Terreiro do Paço!

Sobre a STCP, empresa equivalente à Carris e que opera na zona do Porto, as contas também não são famosas:

Receita 2011:       69 milhões euros
Despesa 2011:     122 milhões
Resultado 2011:    - 54 milhões
Em comparação: Resultado 2010:  - 37 milhões

Resultado operacional 2011: -6,3 milhões
Resultado operacional 2010: -9,2 milhões

O resultado operacional em 2011 até foi menos mau do que em 2010, mas certamente que os encargos da dívida aniquilaram essa melhoria operacional, já que os prejuízos totais "saltaram" de 37 para 54 milhões.

Balanço 2011:
Ativo:                  109 milhões
Passivo:               440 milhões
Capital Próprio:   - 330 milhões de euros. Mais uma empresa totalmente insolvente
Em 2010 o capital próprio era de -275 milhões, ou seja, de 2010 para 2011 a STCP agravou ainda mais a sua condição económica

Mesmo que estas empresas comecem a apresentar resultados operacionais positivos, estes não são suficientes para compensar os custos da dívida que foi herdada no passado e que todos os anos se agrava.
A STCP obteve 110 milhões de novos financiamentos em 2011 e 94 milhões em 2010. É quase o dobro dos seus resultados. Totalmente insustentável.

A Carris também apresentou em 2010 resultados bastante negativos e o seu balanço é uma autêntica vergonha à semelhança das suas empresas "primas".

Metro do Porto -
Deixámos de fora a receita e a despesa por não estar totalizada no relatório e contas, obrigando a umas contas..
Resultado 2011:     -397 milhões de euros
Resultado 2010:     -352 milhões

Resultado operacional 2011: -233 milhões
Resultado operacional 2010: -244 milhões
Prejuízos operacionais muito pesados, bastante piores do que a CP ou a Metro de Lisboa

Balanço 2011:
Ativo:  2,39 mil milhões
Passivo: 3,66 mil milhões
Capital Próprio em 2011:   - 1,269 mil milhões. Totalmente insolvente
Capital próprio em 2010:    -924 milhões. O capital próprio agravou-se em 37% de um ano para o outro. É muito grave.

Os financiamentos são gigantescos, certamente devido à política expansionista em abrir linhas novas e finalizar outras quase concluídas:
2,4 mil milhões em 2011
2,1 mil milhões em 2010

Em condições normais, ou seja, num cenário em que o Estado não daria aval aos empréstimos que a Metro do Porto pede aos bancos, esta empresa veria-os negados ou com juros proibitivos, e por explosão de tesouraria teria já fechado as portas.
Estes são investimentos de uma grandiosidade totalmente incompatível com a riqueza produzida na região, ou seja, pela receita total de bilheteira.

Porto, Gaia, Vila do Conde, Matosinhos, Maia e Póvoa do Varzim precisariam de poupar durante décadas para se poderem dar ao luxo de "oferecer" este serviço às populações. Não o fizeram e preferiram atalhar caminho.
Dinheiro? Isso arranja-se, é preciso é fazer obra. Pois, mas depois dá nisto

Estudei no Porto antes de haver Metro do Porto e não posso dizer que fizesse uma falta terrível... As pessoas adaptavam-se ao que havia, e posso dizer com propriedade que as gentes do Norte, se há coisa que sabem é adaptar-se às circunstâncias e sobreviver às contrariedades, saindo sempre mais fortes. Mas com políticos e gestores assim a enterrá-las, confesso que não é fácil.

Tiago Mestre

5 comentários:

Filipe Silva disse...

O norte do país é onde se produz e exporta mais em Portugal, e onde o poder de compra é o mais baixo do país,

As contas do metro de lisboa, estão camufladas, dado que muito foi realizado com acesso a fundos da União europeia, tenho ideia de que os do metro do Porto, não usufruiram de tais apoios.

Não defendo a despesa do Estado, mas gosto de ser coerente com a realidade, e a realidade demonstra que o norte do país foi altamente lesado, dado que a divida criada pelos políticos foi em proveito de Lisboa e não do resto do país

Convêm lembrar que no tempo de Sócrates, foram desviados milhões de € de fundos da UE afectos ao Norte, para Lisboa ( dado que lisboa ao ter 120% do poder de compra da media da UE já não tem direito).

O país tem sido lesado, com o continuo beneficio dado a Lisboa.

Quando se fala que o salário tem de descer, não é o do país, mas sim o de Lisboa, que segundo dados do INE é superior em 40% ao resto do país, sem justificação económica.

Lisboa tem muita coisa e nunca poupou para isso, se O Porto não deveria ter direito a metro, Lisboa muito menos.
O metro melhorou muito a cidade em termos de mobilidade, e em termos de atratividade turística.
O ser humano adapta-se, por isso sobrevive.

O problema de Portugal, passa por ter uma distribuição de rendimento assimétrica, criada pelos políticos.
O português é pouco produtivo, mas não o do Norte, o problema reside em Lisboa.

Porque a realidade é que Portugal é Lisboa e o resto paisagem nos olhos dos políticos e lisboetas

Tiago Mestre disse...

A minha sugestão mesmo é que o Norte trabalhe com o que tem, e prospere à sua conta.
Não contem com os fundos comunitários, que só servem para alocar capital nos locais errados. Se o Metro não é sustentável, o melhor mesmo é para e não enterrar mais as gentes do Norte.

Lisboa continuará a sorver fundos do Norte: é o custo dos nortenhos em manter o país unido.

Se acharem que não é suficiente, uma desanexação do resto do país e uma "junção" com a Galiza é uma hipótese com uma validade que surpreenderia muita gente abaixo do Mondego.

O Norte tem mesmo que defender o que é seu e exigir a Lisboa que não seja roubado. O abaixamento dos impostos e a redução do Estado traria este benefício indireto de coesão..

Vivendi disse...

O símbolo que uso na imagem é de inspiração ancestral galaica pois são a raíz das minhas origens. O Norte e a Galiza são uma expressão só separados pela ironia da história.

E mais não digo, para não acender ainda mais o debate, pois os problemas já tantos.

Mas gostei muito do artigo que publiquei ontem em que o autor defendia a criação de luxemburgos, lichenstein e singapuras...

Tiago Mestre disse...

Vivendi, já dei uma vista de olhos ao artigo e... concordo em pleno, para variar.
A redistribuição de riqueza através do Estado é uma invenção quase maquiavélica.

vazelios disse...

Carris e STCP a dar mega prejuizos.

Vimeca dá lucro e os seus donos são clientes private.

Diferença?

Umas públicas, outras privadas.

A Vimeca até tem uma pessoa só no marquês de pombal a certificar que os autocarros chegam a horas. Em dia de greve do metro ou da carris, vou a pé para o marquês e apanho a vimeca. Em 5 anos nunca vi uma greve da vimeca.

E duvido que os donos da Vimeca paguem tanto aos administradores como o que o estado paga aos admins da carris.

Não sei as contas de cor da Vimeca, sei que da lucro, e sei que não tem racios de divida monstruosos como as outras duas.

Empresas públicas é no que dá.

Um abraço dum lisboeta!!!! eheh