23 de maio de 2012

O que valem mesmo as nossas exportações?

Caros leitores e leitoras, em primeiro lugar devemos agradecer a todos os exportadores que, neste período difícil que Portugal atravessa, nos têm aliviado de maiores males.

As exportações ocupam aproximadamente 35% do PIB português, sendo que com estas alterações na economia doméstica, ou seja, redução da procura interna, talvez a sua quota chegue aos 40% ou até mais.

Para se perceber melhor:

PIB de 2009 = Consumo Privado (66,6%) + Consumo Público (20,7%) + Investimento (22,3%) + Exportações (33%) - Importações (42,7%)

PIB de 2011 = Consumo Privado (66,3%) + Consumo Público (20,2%) + Investimento (18%) + Exportações (35,5%) - Importações (39,3%)

As exportações têm ganho quota de percentagem relativa no PIB, o que é positivo, mas advêm em parte da queda relativa do Investimento e das Importações.

Se a queda das importações é um bom sinal porque minimiza o défice comercial e promove a produção interna, já o Investimento é uma componente fundamental no desenvolvimento de futuras exportações portuguesas, pelo que a queda relativa desta parcela é vista por nós com certa preocupação.

Acreditamos que em 2012 o Consumo Privado baixe para valores a rondar os 60% e as exportações se aproximem dos 38%.

Quando em 2011 a classe política fez as previsões macro-económicas para 2012, quis acreditar que a redução do Consumo Público (abaixamento da despesa e do défice) não influenciaria de sobremaneira o Consumo Privado, e se as exportações mantivessem o bom ritmo de 2010, talvez escapássemos a uma recessão mesmo com austeridade pelo meio.

Era esse o sonho. Mas rapidamente se percebeu que quem acredita muito em sonhos rapidamente passa a ter pesadelos.
O Consumo Privado não aguentou a pressão do Consumo Público, ou seja, a redução dos salários dos funcionários públicos, o aumento dos impostos, a retenção de 50% do subsídio de Natal, a redução das deduções e outros fenómenos que tais resultou numa redução generalizada do consumo, sobretudo de bens mais duradouros, ou seja, que não fazem tanta falta no dia-a-dia. A venda de automóveis é talvez o melhor exemplo. O desemprego tinha que se impor, era inevitável.
Uns não gastaram porque deixaram de ter, e outros tinham mas preferiram poupá-lo.

O Investimento também se ressentiu, mas esse não depende só de nós, depende da riqueza de terceiros e se  esses se sentem cativados em investir cá. Com o nível de impostos que temos e a justiça que funciona mal, só mesmo os salários baixos e um grau elevado de qualificações é que pode seduzir investidores, quer domésticos, quer estrangeiros. Mas para já, o investimento está em queda, ou seja, o que de bom se fez na educação está a ser neutralizado por questiúnculas de funcionamento da justiça e guerrinhas de políticos.

O Consumo Público ainda tem uma grande trajetória de queda para fazer, já que com receitas totais de 65 mil milhões de euros, o Estado gasta 85 mil milhões de euros em despesa. Esta diferença grosseira de 20 mil milhões de euros tem que ser reduzida a zero.

Mas quando as despesas chegarem aos 65 mil milhões, já a receita não será de 65, porque entretanto as receitas dos impostos caíram e o consumo retraiu ainda mais. O Estado terá sim uma receita de 55 ou até 50 mil milhões. Nestas condições, é necessário continuar a reduzir despesa até que esta iguale a receita. O equilíbrio sustentado entre receita e despesa não sabemos quando será atingido, mas acreditamos que será próximo dos 50 mil milhões ou até menos.

Moral da história: o Estado tem que reduzir a despesa de 85 para 50 a 55 mil milhões. SÃO SÓ 30-35 MIL MILHÕES DE EUROS DE REDUÇÃO.

Genericamente gastamos:
9 mil milhões em juros,
9 mil milhões em saúde,
8 mil milhões em educação,
2 ou 3 mil milhões em obras públicas e
quase 40 mil milhões em segurança social
Somando outras rúbricas menos importantes, como a defesa, a justiça e a administração interna chegamos aos tais 85 mil milhões.

Aceitam-se sugestões desde já para cortar a despesa em 35 mil milhões de euros. Nós já temos umas ideias, mas os eleitores não iriam gostar!

E é preciso ter em conta que já vamos com 15% de desemprego e uma dívida para pagar de 195 mil milhões de euros...

Para sermos realistas, é neste cenário que devemos trabalhar, sem tabus nem medos. Para quem reconhece esta evidência matemática, sugiro que se comece a preparar imediatamente porque não vale a pena ficar à espera dos meios de comunicação social para ganhar consciência desta realidade. O governo continuará a assumir cenários demasiado cor-de-rosa e os media apenas amplificam as "suas" vontades.

A força das exportações como almofada da queda da procura interna possui as suas limitações: depende da vontade externa em querer comprar português e de ter dinheiro para o fazer. Neste aspeto, os cenários macro-económicos dos nossos parceiros europeus e norte-americanos não é bonito de se ver, sendo Angola, Moçambique e Brasil, todas ex-colónias nossas, as nossas grandes esperanças! Mas tanto quanto sabemos, também estes países estão a restringir o movimento de pessoas, bens e capitais. Toda a gente sabe as dificuldades que existem na obtenção de visto para ir trabalhar para Angola ou para o Brasil.
Querem que se invista lá mas depois não querem que o dinheiro saia de lá! Uma espécie de protecionismo de um só sentido.

A médio prazo isto não são boas notícias para nós.

Em conclusão, as nossas exportações dependem muito de fatores que não controlamos, pelo que é nossa sugestão que o governo olhe sempre com cautela para esta rúbrica do PIB e que não se baseie nos impostos dela para prometer aos eleitores dinheiro para isto ou dinheiro para aquilo.

Para já, são as exportações que nos ajudam a ter uma recessão de 3% em vez de 5 ou de 6%, e um desemprego de 15% em vez de 19 ou 20%

Tiago Mestre

13 comentários:

Vivendi disse...

Muito bom post.

Mas o ajustamento só com medidas radicais mesmo.

pensões máximas
despedimentos na função publica
reestruturação da dívida e encargos), juros, PPPs e ainda mais na energia?

Vivendi disse...

A limitação das exportações:

Apenas 18 mil empresas portuguesas exportam.

Do lote das 18 mil empresas, 100 empresas são responsáveis por 50% das exportações.

Muitas das nossas exportações tem pouco valor acrescentado e altos encargos com importações, como é o caso dos produtos petrolíferos.

Filipe Silva disse...

A economia está dependente do estado, isto é, qualquer diminuição forte da despesa do estado leva a uma grande recessão.

Como diz Medina Carreira dependem do orçamento do Estado 5milhões de portugueses, logo qualquer alteração da sua despesa vai ter implicações dramáticas no tecido social.

O empréstimo bilateral da troika permitiu aos políticos não terem de assumir que o país esta em bancarrota. Os media como não lhes interessa não transmitem esse facto há população, a realidade é que sem o empréstimo a mudança mentalidade social seria muito mais rapida e mais forte.

O estado social é impossível de manter na sua forma actual.

A divida de Portugal não é só a do Estado, a privada também é muito importante, e esta corre o risco de se entrar em default devido ao confisco do Estado para pagar as sua dividas.

Na minha opinião, é necessário uma enorme recessão, para que a economia se reestruture.
O estado deveria cortar qualquer subsidio que dá, RSI, abono de familia, subsidios Às empresas, etc...
Deve dizer que não paga mais pensões acima de 3000
Despede o numero de funcionarios necessarios
Corta nas PPP, extinguir fundações, institutos, observatórios, etc...

Ao mesmo tempo diminuir os impostos, reduzir as regulações, e por ai

Deveria tornar a justiça célere e deveriam apostar no combate há corrupção

Mas como isto vai contra os seus interesses, perdem eleições, perdem dinheiro e vão presos, nada irá acontecer por isso Portugal vai continuar na mesma a arrastar-se.

PS- diziam tão bem do Gaspar, que o PPC era liberal, chegam todos lá e vira tudo Neo-comunista

Vivendi disse...

Filipe,

Portugal está naquele momento se correr o bicho pega se ficar o bicho come.

Meia Europa à espera da boa bondade da Alemanha para seguir o milagre japonês. Quando o milagre a seguir deveria ser o do Chile.

Anónimo disse...

Digam-me lá: faz algum sentido, por exemplo, gastar 750 milhões de euros com a formação de licenciados de enfermagem para depois serem exportados, pro bono, para Inglaterra, Luxemburgo, EUA e Arábia Saudita? Actualmente exitem quse 65 mil enfermeiros com cédula profissional na Ordem dos Enfermeiros e estão empregados 40 mil no sector público... que loucura é esta. Cada licenciado fica nos 4 anos de curso Superior perto de 50 mil euros ao contribuinte português. Fechem-se 90% das Escolas Superiores de Enfermagem...

Tiago Mestre disse...

Já pensei muito sobre a questão das instituições superiores de ensino, e um dia destes faço um post sobre isso.
Estou convencido que teremos mesmo de fechar muitas instituições de ensino superior.
Alunos serão cada vez menos,
Professores são muito caros,
Cursos de qualidade duvidosa,
Saídas profissionais praticamente fechadas.

E, mais importante ainda: há falta de bons eletricistas, bons canalizadores, bons agricultores, bons serralheiros, etc, etc. Confronto-me com isso tudo o santo dia na minha atividade profissional.

Acabar com cursos superiores seria, para mim, o início da grande reforma em Portugal:

Realocar recursos humanos onde eles são mais precisos e que custam pouco ao Estado.

Vivendi disse...

concordo!

tem de se inspirar no ensino de antigamente.

Uma boa formação de base e escolas técnicas. O superior para os melhores e não para as massas. Quem tiver o sonho de um curso que o pague.

o programa de Medina carreira foi bastante elucidativo esta semana.

Tiago Mestre disse...

Não vi o programa. Tive um aniversário...

Vivendi disse...

Ei-lo aqui:

http://www.youtube.com/watch?v=yB0RhO_xWSI&feature=g-user-u

Filipe Silva disse...

Concordo plenamente com o Anónimo, já disse isto em conversa com amigos, e fui cruxificado, é de uma extrema estupidez estar a formar pessoas que depois vão aumentar o desenvolvimento de outros países sem estes terem gasto um tostão.

O estado deveria não financiar os cursos superiores, mas isto vai contra a constituição socialista que temos.

Os cursos superiores, alguns tem qualidade, outros nenhuma, a opinião do vivendi
e identica há minha

Anónimo disse...

Obrigado pelos vossos comentários... o exemplo que dei, como bem interpretaram, aplica-se a muitos outros Cursos Superiores.
Respeitosos cumprimentos,
JB

TRabalhar FaZ caLoS disse...

Eu tenho um sonho, que é ganhar dinheiro todo santo dia, com facilidade, por uma actividade que me faça pensar tanto, como quando as rotativas estão a "fazer" dinheiro. Digam lá que não é uma porra destas que toda a gente quer, e infelizmente, isto quando chega como constipação "às altas esferas", toda a gente que já anda constipada, é varrida do mapa, por tal cataclismo molesto.

Tiago Mestre disse...

Imprimir dinheiro é o exercício de moralidade talvez mais complexo para qualquer político:

Se imprimo já resolvo o problema já, com repercussões negativas muito vagas num futuro incerto.

se não imprimo o problema avoluma-se já, rebenta nas minhas mãos, perco os eleitores, deixo de receber salário, mas tomo a decisão moralmente correta que só terá beneficíos num futuro incerto e talvez distante.

Decidir nestas condições E OPTAR pela 2ª não é para qualquer um; é só para quem é estadista e tem tomates do tamanho do mundo.