24 de maio de 2012

...ainda sobre as rendas excessivas no setor da energia

Foi notícia largamente amplificada na semana anterior as rendas excessivas no setor energético que o Estado pagava aos produtores. Este post vem fora de tempo, mas mesmo assim achamos importante dar a nossa visão sobre este assunto

O governo, pela mão de Álvaro Santos Pereira decidiu revogar/alterar alguns destes contratos, tornando-os menos atraentes para os produtores.

Cabe aos produtores decidir se com estas novas condições lhes interessa continuar a investir na produção de energia elétrica em Portugal.

A ENDESA já veio dizer que irá hibernar a Central do Pego, unidade que produziu energia elétrica mais de 50% do tempo neste Inverno que passou.

A EDP também já informou que está a rever a política de investimentos à luz destas novas condições, nomeadamente a futura construção de 2 novas barragens.

Sobre os contratos com produtores em regime de cogeração, estamos de acordo na revogação destes contratos, na medida em que caso o calor como sub-produto da produção elétrica não seja aproveitado, não se justifica a subsidiação. Acreditamos que a maior parte da cogeração em Portugal não aproveita o calor do gerador para os processos industriais do produtor.

As eólicas, que tanta implantação tiveram em Portugal, só assim o conseguiram devido à subsidiação do Estado. De outra forma haveria muito menos eólicas, algo que seria desejável à luz do que se sabe hoje. Temos demasiadas eólicas subsidiadas que, em dias de total ausência de vento, exige-se a compensação a 100% por parte das hídricas e das centrais convencionais a carvão e gás natural. Cortar neste contratos obrigará aos produtores a fazerem contas, contudo desconhecemos se os cortes são fortes ou fracos, e de que forma isso afetará a rentabilidade do negócio. Uma coisa é certa, este dinheiro que os produtores recebem é essencial para que o investimento se mantenha de pé. Todo o negócio foi efetuado nestes pressupostos de rentabilidade. Sem dinheiro não há produção de energia elétrica.

Quis-se tornar Portugal num país tendencialmente isento de importações de combustíveis fósseis para a produção de energia elétrica. A ideia é bonita mas não funcionou. Precisamos sempre de ter centrais térmicas em stand-by à espera dos dias em que não há vento nem água. 

Só para lembrar: a energia elétrica não se acumula. O que se consome é instantaneamente produzido.

E sobre as centrais térmicas e hídricas que estão à espera de produzir quando não há vento, até aqui eram subsidiadas pelos contratos de potência garantida. Estes contratos, tanto quanto sabemos já vêm do tempo do Eng. Mira Amaral, Ministro da Energia e Indústria do tempo de Cavaco Silva. Foram anuladas há uns anos e voltaram em Agosto de 2010.
Desta forma assegura-se a permanente disponibilidade das centrais em caso de necessidade, que ocorre com bastante frequência. Cortar nestes contratos de potência garantida é pegar pela "ponta errada do pau", julgamos nós. Estes já existiam antes do advento das eólicas e não era por acaso: ao longo do dia há uma grande oscilação no consumo de energia elétrica e há centrais que estão paradas ao longo do dia à espera de "entrar".

Sempre assim foi porque tecnicamente é esta a realidade, e se juntarmos as eólicas à equação, ainda pior, porque além da variação do consumo ainda temos que acrescentar a variação da produção pelas eólicas. É mais complexidade que se adiciona ao sistema.

Cortar nestes contratos de potência garantida é sugerir no médio prazo que em condições de pouca água e nenhum vento não haja centrais térmicas suficientes para garantir o abastecimento de energia elétrica em Portugal. Quem tanto gostaria de cortar à bruta nestas rendas, certamente que, por exercício de coerência, não se importaria de ser o primeiro a deixar de ter em casa energia elétrica, caso não haja energia para toda a gente.

O assunto veio para a praça pública pessimamente mal explicado pelos políticos. Preocuparam-se mais em dizer que o dia era histórico e outras banalidades, em vez de explicar o que verdadeiramente se passou e os riscos que corremos em cortar unilateralmente nestes contratos de abastecimento de energia elétrica. Criaram-se as condições para a ignorância ser rainha e a opinião pública cobaia desta.

Para agravar a situação, o presidente da Endesa afirmou que o governo não foi sério. Disse uma coisa à porta fechada e depois promulgou outra. Não temos motivos para desconfiar da pessoa, pelo que ficamos preocupados quando assuntos desta importância se tratam desta forma.

Tiago Mestre

2 comentários:

Vivendi disse...

Tiago,

A partir de um certo ponto o racional já não conta, entrega-se à sorte. Ainda mais quando a questão diz respeito a dívidas.

Tiago Mestre disse...

também concordo contigo. Já cheguei a essa conclusão e talvez por isso ainda insista em dar alguma visão racional das coisas, na tentativa de esclarecer um pouco mais..

Se houver alguém que incorpore estas ideias por desconhecê-las e altere um pouco a sua opinião, já não é mau.

A irracionalidade não nos permite avaliar as consequências dos nossos atos, e, de asneira em asneira, continuamos a trilhar o caminho do disparate. Custa-me a aceitar isso assim tão ao de leve..