1 de maio de 2012

Juiz decide substituir-se aos contratos livremente assinados (Parte 2)

Tendo este post sido objeto de uma boa discussão aqui no Contas no espaço de comentários, decidimos fazer novo post para relevar as decisões que foram proferidas pelo acórdão do juiz de Portalegre e pelas opiniões do juiz Rangel e do Bastonário Marinho Pinto, proferidas ontem no programa Justiça Cega, transmitido na RTP Informação.

Eis a justificação do juiz para "anular" o remanescente que o banco exigia ao devedor:

 "Os juros contraídos e a suportar pelos inventariados e a hipoteca são imediatamente 
derivados do valor patrimonial do valor atribuído ao imóvel de 117.500,00€, no sentido em 
que aquele valor  acerta o montante da remuneração do empréstimo e  determina o 
funcionamento jurídico da garantia real.

O credor, mercê de um processo judicial executivo legítimo e válido, dispõe agora 
de um bem pela quantia de 82.250,00€, pretendendo manter-se na titularidade activa de um 
crédito funcionalizado ao valor do bem de 117.500,00€.

Entre a posição de mutuário e a posição de adquirente do Banco …, S.A. subsiste 
uma diferença de 35.259,00€ (trinta e cinco mil e duzentos e cinquenta e nove euros) para 
um mesmo bem imóvel.

Este exercício, apesar de regular na aparência do Direito adjectivo – aquisição por 
70% do valor patrimonial, afigura-se-nos que acarreta uma consequência iníqua ao nível do 
direito substantivo que seria a circunstância de os inventariados se obrigarem a um 
complexo de créditos em função de um valor da coisa (valor esse participado pelo credor 
no processo negociativo e em instância executiva), ficarem na indisponibilidade desse bem e manterem-se na obrigação de pagamento por incumprimento de mútuo de escopo no valor 
total 117.500,00€. 
[...]Os inventariados são hoje devedores de uma determinada quantia para aquisição de 
um bem do qual já não dispõem e que  reverteu ao credor da dívida por um valor 
substancialmente inferior àquele que configura a sua obrigação e que consubstanciou a 
materialidade subjacente da relação contratual: o valor patrimonial de 117.500,00€. 
É a este valor do bem, mercê da aquisição pelo credor hipotecário, que deve ser dada 
primazia pela materialidade subjacente na tutela judicial."


Segundo percebemos, o juiz assume que o valor patrimonial da habitação é e será SEMPRE de 117.500,00€ para efeitos de "funcionamento jurídico da garantia real", independentemente da habitação ter sido avaliada posteriormente em 82.250,00€ e o banco a ter aceite por esse valor como forma de abater a dívida.

O que isto quer dizer é que o que conta para o tribunal é o valor do empréstimo, consubstanciado no valor do imóvel à data da assinatura do contrato. Se o imóvel, hipoteca do empréstimo, desvaloriza à posteriori, fruto da quebra do mercado imobiliário, é irrelevante para o caso.
Paralelamente, a obrigação no pagamento do remanescente possui um carácter iníquo por se exigir ao devedor o pagamento de um valor referente a um imóvel que este já não possui e não usufrui.

No programa Justiça Cega, o Juiz Rangel pronunciou-se a favor desta decisão, mesma que esta possua algumas falhas ou erros (palavras dele), realçando o carácter humano e social que os juízes devem ter na análise de casos desta natureza.
Marinho e Pinto pouco falou, referindo que ainda não tinha lido a decisão do juiz e que pronunciar-se-ia após a sua leitura.

Perante a explicação do juiz de Portalegre, ficamos na dúvida sobre o que pensar...
Agradecíamos os vossos comentários para ver se formamos uma opinião mais realista.

Tiago Mestre

1 comentário:

Vivendi disse...

Portugal tem de deixar de pensar muito e seguir mais os bons exemplos.

Como chegamos todos à conclusão o caso espanhol é um bom exemplo.

Desde há duas semanas que quase todos os bancos espanhóis partilham um código de boas práticas bancárias lançado pelo executivo de Rajoy. Entre as medidas contempladas encontra-se, então, a possibilidade da entrega do imóvel ao banco ser suficiente para saldar a dívida contraída com o crédito à habitação.
DE

PS: Não é necessário legislar por tudo e por nada, neste caso sugeriu-se um código de boas práticas.

Extraído do blog Portugal Contemporâneo.

Procure-se assim seguir os bons exemplos para as imensas situações que assim o exigem invés de andar por aí a inventar.