15 de maio de 2012

Crise financeira: de quem é a culpa? Dos políticos? Ou dos Mercados? (Parte2)

Caros leitores e leitoras, temos ouvido aqui e acolá algumas reacções criticando a vantagem abusiva dos bancos em adquirirem dinheiro ao BCE a 1% e depois investirem-no em obrigações dos países periféricos a 6,7 ou 10%.

Do que conseguimos perceber destas reacções é que os bancos aproveitam-se da condição frágil dos países e ganham dinheiro com isso. Esta argumentação, à primeira vista, até parece "colar o barro à parede". Mas não é bem assim!

Já referimos noutro post com o mesmo título deste, que o juro reflete o risco que o credor pressupõe existir ao transferir temporariamente a alguém uma parte da sua riqueza. O juro é o prémio do risco que o credor toma.

Na nossa análise, se os juros das obrigações estão a 6, 7 10 ou 12%, isso significa que os credores perderam confiança para com o devedor, talvez pelas atitudes irresponsáveis de políticos que abusaram da dívida sem salvaguardarem a sua sustentabilidade.

Vai daí, é nossa opinião que o juro que atualmente se pratica reflete o risco real das dívidas soberanas.
Aliás, o risco real esteve camuflado durante muitos anos com o advento do euro, e os políticos embalaram na lenga-lenga que o risco nominal correspondia ao risco real.. Errado

Por exclusão de partes, consideramos que o problema não está nos mercados mas antes nos empréstimos concedidos pelo BCE a 1%. E porquê?
Por que não correlaciona o juro com o risco dos devedores que se candidataram ao LTRO. O que o BCE fez foi uma manipulação grosseira (entre muitas outras) em que se "esqueceu" dos princípios da boa finança e, em nome dos contribuintes, emprestou com critérios duvidosos, ou até mesmo contraditórios. Do que conhecemos, o BCE exigia aos bancos do LTRO que apresentassem obrigações soberanas como garantia, mas só que também elas são consideradas lixo ou quase. Eis um exemplo de um critério altamente duvidoso. Juro de 1% com maturidade de 3 anos são condições mais do que generosas, são mesmo aviltantes para o cidadão comum. Quem nos dera ter um banco!!

Para se perceber o ridículo da situação:
Caso o banco X não pague ao BCE o que pediu, terá que apresentar as obrigações como garantia, mas que dizer da qualidade destas se são consideradas lixo e perdem valor semana sim semana também? O BCE usou este expediente, não para se salvaguardar, mas para "estimular" os bancos a adquirirem dívida soberana, baixando a percepção de risco deste tipo de ativos e assim ajudar um bocadinho os políticos famintos de credores que lhes emprestem qq coisa.

Mas os mercados, atentos a esta errada avaliação de risco por parte do BCE, tomaram providências para se protegerem. E como?
Identificaram os bancos europeus do LTRO, que são sobretudo do Sul da Europa, e marcaram-nos com um índice: LTRO bank credit spread
Os que não foram ao LTRO ficaram noutro índice: non-LTRO bank credit spread

Feita a análise técnica pelos especialistas, toca de fazer gráficos e atuar em conformidade, cortesia ZeroHedge


O que se percebe do gráfico de cima é que a partir de Março de 2012, após o 2º leilão a 27 de Fevereiro, os LTRO banks começaram a desviar-se nos seus spreads em relação aos que não foram ao LTRO.

O logro estava desmontado e a festa durou um Inverno apenas.


O 2º gráfico diz-nos que entre os 2 leilões, os LTRO banks conseguiram baixar o seu spread (risco), mas rapidamente voltaram para valores pré LTRO já em Maio.

Qual foi a vantagem do LTRO para os políticos?
Comprou 3 meses..

Qual foi a desvantagem do LTRO para todos nós?
1 trilião de euros criados do nada que entraram no balanço dos bancos e na economia sem crescimento económico que justifique tanta entrada de dinheiro.
E já todos sabemos o que acontece quando há mais dinheiro a perseguir os mesmos bens!

A suposta vantagem concedida pelo BCE aos bancos LTRO foi já neutralizada pelos mercados, voltando tudo à estaca zero.

A manipulação, já tantas vezes aqui referida no Contas, é sempre uma aldrabice porque tenta condicionar uma realidade muito mais forte do que a força intrínseca da própria manipulação.

É como a mentira: tem sempre pernas curtas.

Tiago Mestre

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