16 de setembro de 2012

Queremos continuar em Portugal, ou não?

Caros leitores e leitoras, mais cedo ou mais tarde teremos que nos perguntar a nós próprios:

DO QUE É QUE EU ESTOU DISPOSTO A ABDICAR E QUE CONSIDERO ESSENCIAL À MINHA VIDA?

Compreendemos as razões que levaram a população a manifestar-se ontem, mas também julgamos saber que aquilo que os manifestantes pedem já não será possível dar, ou seja, a vida que outrora se levava não mais existirá porque a matemática não deixará.

Temos que nos perguntar a nós próprios se:

1. Aceitaremos viver com salários a rondar os 500€ com formação superior no curriculo

2. Estaremos dispostos a viver em casa dos papás por tempo indeterminado

3. Será possível ter filhos no contexto económico dos próximos anos

Estas perguntas, entre MUITAS outras, serão aquelas a que teremos que dar resposta se quisermos ficar em Portugal.

Quando os manifestantes pedem a saída da troika e a recuperação das suas vidas, não percebem que sem troika não há dinheiro para o dia-a-dia, e sem dinheiro o cenário será ainda mais agressivo. Talvez acreditem que o BCE e a Europa emprestarão ad infinitu , mas até essa hipótese está muito longe de lhes devolver a vida que tanto desejam.
Imprimir dinheiro significa gerar mais dívida e posteriormente inflação, e como já foi estudado por pessoas que percebem do assunto, nem o PIB nem os salários acompanharão essa inflação, e portanto a quebra do poder de compra será inevitável.

Com austeridade ou sem austeridade, o retorno a padrões de vida que julgávamos do passado será uma realidade. Não porque queremos ou deixamos de querer, mas porque na última década entraram por ano 31 mil milhões de euros que algum dia teriam que ser pagos.
Em paralelo, a indústria e a agricultura, motores do verdadeiro desenvolvimento mas que exigem trabalho e esforço, foram sendo substituídos por subsídios e dolce fare niente e o Estado, falso guardião de tudo e de todos, tornou-se uma máquina de dar de comer a metade da população, quando não tem armas internas para prover esse sustento.

Todos nós devemos mais de 550 mil milhões de euros, que a uma taxa de juro média de 5%, equivale a termos que "arranjar" todos os anos mais de 27 mil milhões de euros SÓ PARA PAGAR OS JUROS AO EXTERIOR.

Imaginem a calamidade que não seria caso os bancos internacionais fechassem completamente a torneira e não nos permitissem continuar a pedir dinheiro emprestado lá fora.

De repente teríamos que "arranjar" os tais 27 mil milhões sem recorrer ao exterior, e como sabemos que ele não existe cá dentro, só poderíamos indicar a bancarrota generalizada como o único caminho. Tanto deixaríamos de liquidar os juros como o capital, já que com um PIB de 170 mil milhões, não há muito que se possa fazer.

Seria uma bancarrota estrondosa e de consequências imprevisíveis, mas pelo menos começávamos logo a viver dentro das nossas possibilidades. Isso era garantido.

Quando se pede à troika para se ir lixar, e caso esta fosse mesmo embora, seria este o cenário em cima da mesa, entre outros, claro, mas não muito diferentes.

A nossa sugestão aos manifestantes é esta:
Cuidado com o que desejam, porque ao criticarem o que agora existe, arriscam-se a ter aquilo que verdadeiramente não querem.

Porque só quem está disposto a abdicar de muita coisa na sua vida, e que já tratou de arranjar planos B, é que aceitará cenários de bancarrota completa.
Será que os manifestantes de ontem já passaram essa fase na sua vida e já deram as respostas à pergunta acima colocada?

Como nação, quanto mais depressa dermos respostas à pergunta, mais depressa perceberemos a fragilidade de todo o sistema, e com mais vontade estaremos dispostos a abdicar de cenários irrealistas.

Trata-se de "nascer" novamente, sem as ideias preconcebidas com que nos lavaram o cérebro na nossa adolescência de que caso estudássemos tudo seria melhor do que antigamente.

Trata-se de esquecermos os culpados da crise, e até perdoá-los, caso haja condenados, e ver a imoralidade do sistema como uma coisa do passado, ganhando assim energia para nos voltarmos a apaixonar pelas coisas simples, a natureza, a comunidade, a terra, e saber ser feliz com tanto, quando julgávamos ser tão pouco.

É sempre um problema de perspetiva, de não querer abdicar da sua e de dificilmente aceitar outras que estejam ali ao virar da esquina.

Tiago Mestre

9 comentários:

Filipe Silva disse...

Bom dia

A análise esta correcta, sem o dinheiro da troika a situação seria muito mais complicada, principalmente porque não é possível antecipar ou prever o que poderia acontecer.

A Argentina que nos anos 40 era dos países mais ricos do mundo, em 2000 declarou bancarrota e ate a classe média alta passou fome, e como se pode ler o no testosteronepit par ali a coisa não vai bem.

A questão de se viver com pouco não se coloca apenas aos que manifestaram-se ontem, mas sim à elite.
Não foram os do salário mínimo e os pobres que viveram acima das suas possibilidades, mas sim O Estado e a dita classe média, que se analisarmos quem são chegamos facilmente a perceber que a maioria é funcionário público.

O problema é que as pessoas não compreendem que hoje o estado não gera riqueza, que não tem capacidade de emissão de moeda, logo não pode imprimir para a pagar as dividas, só resta um caminho vender os activos que tiver e cortar nos beneficios que deu à população.
Mas a vida não é assim tão má em Portugal, temos este Sol, temos praias, algo que os Nórdicos adorariam ter e até eram capazes de trocar parte do rendimento por este privilegio.

Em relação à parte de perdoar os que nos trouxeram aqui, não penso que devemos perdoar assim sem mais nem menos, compreendo que estes se aproveitaram da lei do menor esforço, mas muitos roubaram, e alguns querem regressar ao poder, O PS pede a assistencia financeira 3x em 40 anos e tem a lata de vir falar contra as medidas do governo?

Penso sinceramente que se o povo recusasse a constituição e fosse feita uma em condições, e se desmantela-se a quase totalidade do Estado social a economia tornar se ia dinamica outra vez e com a descida dos impostos associados e com a criatividade nacional depressa regressariamos a niveis de crescimento dos anos 60.

Ricardo Anjos disse...

Parabéns pelo seu Post Tiago! Penso mesmo que o problema está na matemática - nunca fomos grande coisa a matemática. Sabemos que os que fizeram esta e outras manifestações, não fazem ideia do que querem para o futuro, considerando as alternativas possíveis. Manietados por juventudes partidárias acéfalas, que aproveitam para cavalgar descontentamento, pegam em meia-dúzia de cartazes contraditórios e com uns palavrões, e vão para a Praça passear.
Agora reféns dos nefastos efeitos dos discípulos de Keynes, a geração "under 30", não tem futuro assegurado que não seja na vida singela semelhante à dos avós nos anos 60. Há quem diga que é um retrocesso... que é contra-natura... Eu diria que houve alguém que definitivamente foi longe demais na sua gula e que gastou o dinheiro que havia... e muito mais do que isso.
Uma constituição que só fala de "Direitos Liberdades e Garantias" e que omite os "Deveres, Constrangimentos e Limitações", feita à medida por um bando de miúdos que pensavam que para lá do muro de Berlim, é que se vivia bem...
De passagem, diga-se que este Modelo de cruzamento Capitalismo x Socialismo x intervencionismo só podia dar nisto. Seria como cruzar um Camelo com um Chiuaua.

Anónimo disse...

Caro Tiago,

De facto estamos numa fase de enorme reajustamento. Com a economia e a demografia contra nós...

Será terrível, mas as pessoas que ontem foram para a rua - e eu fui uma delas! - não querem ver o seu futuro desde já roubado/destruído (já se fala - explicitamente e no "discurso político" de "15/20 anos" para dominar esta dívida recorrendo a extrema austeridade, pelo que imagino em tempo real e a correr bem será o dobro: "30/40 anos")!!
Isto é uma tragédia e, a ser assim, temos que ponderar alternativas: se é assim tão dramático temos que encarar alternativas e não ir na conversa fiada - que só interessa aos nossos credores - de que a bancarrota é o fim do mundo!!
Eles apresentam esse cenário porque só lhes interessa que paguemos, mas nós temos é que olhar para o nosso interesse: a Alemanha também declarou a bancarrota 2 vezes no sec. XX e em poucas décadas passou a nação-líder!! A Islândia declarou a bancarrota há poucos anos e já está no caminho da recuperação.
E nós, por muito esforço que paguemos, nunca veremos esse esforço reconhecido pelos mercados: ao contrário dos nórdicos islandeses, mesmo que nos desunhemos para pagar a dívida, seremos sempre olhados como "PIGS"! Sempre (com juros altos).
Como em tudo na vida - e os mercados financeiros anglo-saxónicos não são excepção - temos que lutar contra os PRECONCEITOS que os outros criaram contra nós.
Por isso - se dependermos apenas de nós próprios - temos que estudar seriamente o cenário de declarar bancarrota, sair do Euro (da forma mais ordeira que nos for possível) e recomeçar do 0...
Mas a solução ideal - que eu preconizo mas que vejo que o Vivendi e o Tiago Mestre não acompanham - seria termos POLÍTICOS A SÉRIO na U.E. que consigam fazer ver às opiniões públicas dos respectivos países o que realmente lhes interessa em termos estratégicos e de longo prazo, como modo de preservar os nossos valores e modo-de-vida ocidental e fazê-los construir uma Europa FEDERAL ou CONFEDERAÇÃO DE NAÇÕES (sabendo que no curto prazo os mais ricos contribuiriam, mas obrigariam os mais pobres a ajustes graduais, de modo que no futuro todos beneficiariam e até poderiam beneficiar ao contrário). Mas para isso era preciso GARNDES POLÍTICOS que fizessem as velhas nações europeias ultrapassar os traumas do passado e os populismos/nacionalismos que estão na moda (procurando uma solução imediatista para resolver o presente, mas que compromete o futuro).
Carlos Antunes

Anónimo disse...

Será que 605 mil funcionários públicos (menos que os desempregados) é que não contribuem para a riqueza deste país? Onde andam os restantes 10 milhões? Que riqueza produzem?

Vivendi disse...

Bravo! A sociedade portuguesa mais do que ação precisa de interrogação.

As respostas poucos as tem.

Esta década é extramente delicada e tudo aquilo que não for feito em nome da verdade irá resultar em prejuízo para Portugal.

Vivendi disse...

Ontem foi um dia engraçado...

O povo a desesperar, a maçonaria a inaugurar e o Sócrates a jantar...

Como diria o outro, isto anda tudo ligado.

http://sol.sapo.pt/inicio/Sociedade/Interior.aspx?content_id=59170

http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/exclusivo-cm/socrates-reune-estado-maior

vazelios disse...

Eu estou com o Carlos.

Mais uma vez bato na mesma tecla. O Tiago nisto não tem fé.

Mas se a Europa fosse bem gerida, com gente capaz, séria, honesta e até carismatica, iamos ao sitio certo. Como podemos ter fé numa Europa em que o presidente da comissão é um podre ex-primeirno ministro do segundo pior país em termos economicos da UE? um homem que ele proprio fugiu do país para seguir ordens de outros?

Quer dizer, nós temos culturas diferentes mas não nos podemos convergir, e então e os EUA? E o Brasil?

Foram países criados por emigrantes de dezenas de países diferentes. De culturas diferentes. Alias, nessa altura havia mais diferenças que agora...A diferença é que foram liderados por gente capaz carismatica e com sentido de estado - do novo país.

Eu acredito que se possa fazer na europa, apesar da grande historia de conflitos e culturas milenares diferentes que temos, ao contrario dos EUA e Brasil.

Era possivel se tivessemos os melhores no sitio certo. Não temos.

Mir the Bloody Instrumentalz disse...

Muito bom dia,

Apos ler a tua descricao sobre os factos reais do pais e a sua situacao financeira, tenho a indicar que:

- A situacao do actual do nosso Pais, foi criada simplesmente por ambicoes de pessoas tanto do estado como do lobbie corporativo. Nao vale a pena estar a discutir o problema de agora pois desde 1990 ja estariamos a caminhar para esta situacao, pois a crise nao acontece de um dia para o outro e sim sao situacoes orquestradas internacionalmente para causar esta rotura na economia mundial, e realmente varias pessoas encherem os bolsos de dinheiro. A Troika e apenas a escola de Teatro para as situacoes ficarem mais serias e sem o nosso controlo. Digo que vamos ficar com cada vez menos dinheiro e sujeitos a mais controlo financeiro e intelectual. A uniao europeia e uma farca, pois os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres. Gostaria de realcar outro ponto, muito importante, porque ninguem durnte a epoca das vacas gordas contestou uma possivel rotura do sistema e antever esta crise? Dinheiro que e emprestado vai ter de ser um dia pago. Outra questao e quem gerou esta divida nem sequer esta no governo para a contestar ou falar sobre ela. Sera que quem a fez nao a deveria pagar? Que raio de situacao e esta, acordem portugueses pois a Troika nao vai salvar nada mas apenas nos colonizar economicamente e intelectualmente. O meu muito obrigado aos governantes que nos lixaram a vida e que neste momento estao riquissimos sem preocupacoes na vida. Obrigado as privatizacoes e as burlas bancarias no dia de hoje. Isto sem uma revolucao e uma economia de sustentacao troikiana nao vai la. Vamos ficar cada vez mais pobres, Colonizados economicamente. QUe o governo seja capaz e tenha a coragem de expulsar a Troika e retomarmos a nossa economia auto sustentavel, com o nosso arduo trabalho, porque a UE faz-nos ficar preguisocos.

Miguel Garranha
(Lamento a falta de acentuacao)

Anónimo disse...

Acabem mas e com as juventudes partidarias e obriguem quem quer ter cargos de responsabilidade a ter experiencia profissional previa. Acabem com os assesores e com os que se intitulam juristas e metade dos problemas fica resolvido. Essa gente que comeca com 15 anos no compadrio e intriga politica e o cancro do sistema. Devolvam a politica e os cargos dirigentes as pessoas com principios, trabalhadoras e competentes.
A actual classe politica, a primeira profissional, e o que de pior o pais criou. E cadeia, muita cadeia, inclusivamente para os juizes dos nossos tribunais.