O novo pacote de estímulos que recorrerá à impressão de dólares, QE3, terá como objetivo a redução do desemprego nos EUA, recorrendo à aquisição de obrigações hipotecárias tóxicas aos bancos.
Com esta medida, Ben Bernanke comprará por mês, para começar, 40 mil milhões de dólares, ou 40 biliões de dólares no sistema americano.
Por ano serão aproximadamente 450 mil milhões de dólares que serão depositados nas contas dos bancos em troca destas obrigações que ninguém as deseja mas que estão lá.
Também sabemos que a solvência destas obrigações depende, acima de tudo, do americano endividado que todos os meses tem que arranjar o dinheiro para pagar a hipoteca. Se falha, alguém terá que assumir as perdas, e caso essa obrigação hipotecária esteja do lado da Reserva Federal, esta terá que as assumir, recorrendo à impressão de dinheiro ou então a transferir os lucros das restantes obrigações que possui para tapar o buraco desta.
Este é mais um caso evidente de transferência de risco privado para a esfera pública, corroborando os enormes receios que uma parte da população sente com o moral hazard.
Paralelamente, os investidores fazem as suas contas, e com medo de que a inflação devore a pouca yield que estão a receber dos seus investimentos, começam a pensar em trocar dólares por outra coisa qualquer. Ninguém quer ter investimentos que rendam 3% ao ano quando a inflação é 4%.
E porque os investidores pensam assim, também os governadores dos bancos centrais de outros países, como o Banco do Japão por exemplo, ou da Suiça, têm também que fazer umas contas, porque já sabem que haverá gente interessada em vender dólares e comprar yens ou francos suíços.
Se há muita procura dessas moedas e pouca oferta, o preço da moeda sobe, fortalecendo-a, só que tal fenómeno deixa os políticos preocupados com a economia, já que as exportações podem sofrer consequências. E o que fazem?
Pedem aos respetivos bancos centrais para imprimir yens e tantos francos suíços em quantidades ilimitadas para comprar todos os dólares que os investidores queiram largar, evitando que a moeda se valorize ainda mais.
Conclusão: São obrigados a comprar dólares e euros às paletes só para satisfazer os investidores que estão ávidos de comprar yens e vender dólares.
Por aqui também se percebe que Ben Bernanke ao imprimir está a desvalorizar o dólar, "exigindo" indiretamente aos outros governadores que imprimam também.
É o jogo de quem destrói mais depressa a sua própria moeda, sendo o dólar a moeda que tenta tomar a dianteira desta guerra. E como serve (ainda) de referência para muitas transações no planeta, ninguém quer fortalecer a sua moeda perante o dólar, logo, se o dólar está sendo desvalorizado, ninguém quer ficar para trás na corrida.
Como irá isto acabar? Não sei, porque neste momento, os investidores precisam de alocar o seu dinheiro em algum sítio, e sabem que as alternativas são poucas porque as suas movimentações são acompanhadas pelos governadores também se tentam antecipar à jogada.
Basicamente, com yields tão baixinhas nos investimentos mais seguros, para não dizer negativas, o pessoal tem que arriscar em produtos mais arriscados para ver se ganham qq coisa, leia-se obrigações soberanas mais problemáticas, mas também essas, agarradas a países que estão sem condições para pagar essas mesmas obrigações e atafolhados em défices e em despesa, não é fácil e o risco de perder dinheiro é real.
Esta é a ironia das taxas de juro a 0%:
Inicialmente disseram-nos que serviria para "ajudar" os bancos e investidores a alocar dinheiro na economia e ajudar esta, mas à medida que o tempo vai passando, o dinheiro não foi para a economia mas para produtos financeiros, e estes, direta ou indiretamente agarrados à taxa de juro de referência, caíram todos na sua yield para valores próximo de 0%, deixando outra vez os investidores a coçar a cabeça.
Baixar taxas de juro ajuda efetivamente a inundar o mercado de dinheiro, leia-se liquidez, mas como já todos sabemos, muito dinheiro a perseguir os mesmos produtos financeiros torna estes cada vez mais valiosos e logo, com menos yield (o caso das obrigações alemãs ou americanas é evidente.)
Moral da História: ganha-se em liquidez, perde-se em solvência
De que vão as empresas de investimentos sobreviver se os produtos financeiros que estão ao seu dispor apresentam rentabilidades negativas ou zero? Há malta que vai para as ações, metais preciosos, petróleo, agricultura, mas não chega, ou seja, assistiremos à destruição de muitas destas empresas.
E atirar dinheiro fresquinho nas suas contas bancárias só servirá para que estas sobrevivam mais um dia, hipotecando ainda mais o dia seguinte.
Será que é assim que se compram guerras?
Há, e já me ia esquecendo, não serão só as ações a subir com este novo estímulo:
Tiago Mestre
7 comentários:
desculpe a pergunta, mas há algo que nao consigo entender.....o ben imprime logo euro valoriza, se for o Draghi a dizer que vai imprimir então o Euro tambem valoriza...qual a explicação?
ass: David
Se imprimirem os dois, desvalorizam os dois, valorizam outras moedas.
Se imprimirem yenes, yuans, francos suiços, dollar e euro, desvalorizam todos, e o preço das commodities, ouro, petroleo (se não quebrar muito a procura) disparam.
Penso eu...se não for assim o tiago corrige-me.
Cmpts
David, basta o dólar perde valor mais depressa do que o € para que o € suba em relação ao dolar.
É que Ben quando diz que vai imprirmir, imprime mesmo.
Quando Draghi diz que quer imprimir, tem a oposição alemã, o tratado de Lisboa, precisa de montar um esquema complicado de aquisições, e ainda exige sacrifícios aos países que beneficiarão do dinheiro.
Espanha e Itália já vieram dizer que nestas condições não estão interessados no dinheiro, tendo beneficiado nestas últimas semanas da queda das taxas de juro.
Exatamente porque os investidores acreditaram nas palavras de Draghi e desataram a comprar obrigações na esperança de as venderem mais tarde ao BCE por um preço superior.
Com esta folga que os investidores deram, Rajoy e Monti já recuaram, beneficiando deste momento de juros mais baixos. É uma confusão e um jogo muito complicado.
Nos EUA, quando dizem que vão imprimir, é a sério, na Europa, logo se vê.
Esta pode ser uma potencial explicação.
“democracy is window dressing for elite control.”
Vejam a atitude do Brasil face ao tsunami monetário...
http://economia.estadao.com.br/noticias/economia,brasil-ja-coordena-estrategia-contra-tsunami-monetario,126690,0.htm
No final das contas, se todas as moedas forem desvalorizadas porque nenhum governador quer a sua moeda mais valorizada do que o dólar, só sobram as commodities e os metais preciosos, basicamente coisas que são úteis e /ou preservam valor durante muito tempo.
O ouro e a prata acabarão por ser uma espécie de fuga à desvalorização, algo que o homem comum pode possuir mas que não é sujeito a manipulação efetuada por terceiros.
É semelhante ao fenómeno da fuga aos impostos, em que o escape ao confisco e à usurpação do poder de compra (carga fiscal) é fugir do sistema (fuga aos impostos)
E é também por isso que os políticos detestam tanto o ouro e prata, porque não serve para quase nada, a não ser para preservar valor, estando acessível ao cidadão em qualquer esquina e impossível de confiscar pelo próprio governo.
Uma espécie de Robin dos Bosques dos tempos modernos a que os pobres recorrem como forma de fugir às garras dos ricos (em papel)
....para fechar este assunto...penso que este texto é claro:
http://chevallier.biz/2012/09/circulation-et-creation-monetaire/
O draghi não cria...faz circular.
Ps: Vale a pena ver o video de Nigel farage do dia 19
David
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