8 de julho de 2012

Brussels, we have a problem! (Parte 3)

Em resposta aos comentários do Ricciardi no post anterior, achamos preferível fazer um novo post:

Sobre o saldo primário estar praticamente equilibrado, se excluirmos os custos da dívida:

É verdade, ou quase verdade, na medida em que estamos a caminhar para lá.
É sempre de louvar estes resultados.

Mas este equilíbrio parte de um pressuposto: é preciso arranjar 65 mil milhões de euros em receitas todos os anos.
Pergunta: É possível?                           Resposta: Sim
Pergunta: É sustentável?                      Resposta: Não me parece

E porquê? Porque 65 mil milhões significam 39% do PIB. É muito para um país com a nossa cultura. Para países com o PIB per capita como o de Portugal, que revela muito da nossa cultura, acredito que com impostos acima de 30% do PIB entramos em território desconhecido, a saber:

- fugas massivas aos impostos. chico-espertismo entra em ação

- incumprimentos no pagamento dos impostos - empresários não possuem cultura suficiente para gerir um bolo de dinheiro tão grande todos os meses que não lhes pertence, nomeadamente pagamentos ao fisco e à SS.  Os 23,75% da TSU é dinheiro que o empresário retêm ao trabalhador e tem que o entregar ao Estado.  O IVA é outra tentação: 23% sobre as transações é muito dinheiro.
Se a tesouraria estiver apertada e tivermos fornecedores a ameaçar suspender fornecimento e trabalhadores sem receber, já sabemos quem fica para trás.
Na minha empresa movimento uns euros valentes por ano, e fico abismado com o dinheiro que se me escorrega pelas mãos, ou seja, que entre e que sai sem o ver. Basta não conseguir pagar 2 ou 3 meses ao Estado e a dívida entra logo na casa das dezenas de milhares. Acabou-se.

- 65 mil milhões é um bolo muito grande de dinheiro para gerir pelo Estado. Todos temos tentações, e quando a tentação é grande, muitos sucumbem. Funcionários públicos e políticos não são exceção. Acredito que só assim é que a corrupção começará a diminuir: menos transações entre Estado e privados. já escrevi sobre isto.

- Desgaste emocional coletivo da Nação pelos motivos de Má Moral. Quem paga acha-se parolo porque quem não paga exibe sinais exteriores de riqueza que até mete nojo. Perdemos as pessoas que querem contribuir e ganhamos as que querem aproveitar a boleia grátis. Má moral é um vírus que se espalha e corrói os fundamentos que unem uma sociedade.

Se reduzirmos as receitas de 39% do PIB para 30%, significa diminuirmos as receitas de 65 para 50 mil milhões. Um corte de 15 MIL MILHÕES.  É muita massa.

E a juntar aos 10 mil milhões de euros de défice que temos por ano, voltamos àquele valor que já aqui falámos no Contas:

É preciso reduzir a DESPESA 20-25 MIL MILHÕES DE EUROS.

É este o desafio. Mais mil, menos mil, mas a essência é esta.

Sobre a solução de negociar com a troika um regime fiscal que favoreça a atração de investimento e mantenha rédea curta com a despesa


Não poderia estar mais de acordo contigo. Todas as soluções que nos ajudem a reduzir carga fiscal e continuar com a austeridade são sempre bem vindas.
Sugeri uma pseudo-solução num comentário há uns tempos e volto a reforçar aqui:

Acordar com a troika a suspensão indefinida dos pagamentos dos juros referentes à dívida que é detida pelo FMI, UE/EFSF e BCE.
É uma proposta que não será consensual entre os leitores do Contas, mas enfim, fica o desafio e que a melhor ideia vença.

Seria um desafio para a troika digerir esta proposta, mas dentro de 1 ou 2 anos estaremos a pagar 11 mil milhões em juros se nada se fizer:
6 mil milhões para a troika,
5 mil milhões para os restantes credores privados.

Cortar com 6 mil milhões de euros na despesa seria uma ajuda e reporia a tal moralidade que todos os portugueses clamam:
"Quer dizer, corta-se nos contratos dos trabalhadores públicos e privados, mas nos contratos dos credores nem se lhes toca."

Digam de vossa justiça.

Tiago Mestre

5 comentários:

Anónimo disse...

Na minha opinião, cortem na despesa, despeçam funcionários públicos, mesmo sem indemenização pois existem por ai alguns que fazem tanta asneira que a sua indemenização ficava por compensação de estragos, médicos, advogados, professores.
Só assim se farão os cortes necessários antes da troika cá chegar para receber e quando não houver € com que pagar vai tudo à viola. Assim corta-se como tem de ser já. Paguem os subsidios aos FP mas mandem embora já aqueles que nada fazem e os que fazem mal, não é assim tão dificil uma avaliação. No privado o trabalhador tb pode ser muito bom, mas se a empresa fecha o seu departamento vai para casa como os maus.
Entalem umas empresas chave... grupo melo (brisa/cuf), mota-engil, lusoponte.

Jorge disse...

Ora pois, cá está.

A táctica aqui agora é, Não podemos cortar nos Funcionários vamos ao bolso de todos!!!!

O que ninguém quer ver é que a despesa está descontrolada e a única maneira de sacar mais algum é ir ao bolso de todos 7,9% de défice corresponde a 5530 milhões de € (Com base no 70 000 milhões de € previstos no orçamento de estado) mais coisa menos coisa subsídios correspondem a +-1000 milhões que, mesmo assim não vão ser pagos este ano. ( aliás a primeira coisa que pensei daí a seis meses também vêm aos privados)e é o que está a acontecer.

Medidas avulsas não nos safam, aliás não temos salvação e a única coisa positiva que poderia acontecer era estruturar-mos bem o nosso estado para podermos beneficiar melhor do reebot que, sabemos vai acontecer mais à frente.

Quanto aos despedimentos não é a mesma coisa eu trabalhar numa empresa privada e ser despedido e despedir elementos fundamentais ao funcionamento da nossa sociedade, Homens do lixo, funcionários das aguas, das estradas, médicos... .
Sim à gente a mais mas o despedimento terá que ser bem delineado e bem ponderado por todos nós.

E ninguém está a pensar e sobretudo a preparar o pais para a nossa re-estruturação.
Vai ser uma sarrabulhada, vai ser a quente e como a maior parte dos comentários que se podem ler, numa primeira fase caímos em cima de alguns e vai haver retaliação ( isto soa muito coisas do fim do sec XVI principio do sec XX ).

Tiago Mestre disse...

Jorge, ainda é pior.

O Défice mede-se em função do PIB (170 mil), ou seja, 7,9% significa um prejuízo do Estado de 13 mil milhões de euros.

Eu tenho usado como referência 10 mil milhões de prejuízo nas contas que vou fazendo, o que corresponde a um défice de 6%.

Se calhar estou a ser otimista e deveria ir para os 7,9%

vazelios disse...

Tiago eu concordo com a tua proposta de suspensão de pagamento de juros durante algum tempo. Quem não concorda?

Mas isso não era visto pelo mercado como uma forma de incumprimento?

Já vimos este filme antes, noutros termos e circunstãncias é certo, com a Grécia. Quando se pede qualquer aligeirar, aumentar prazos, diminuir juros, ou mesmo suspender o pagamento, é visto como incumprimento. (Alias arrisco a dizer que suspender pagamento cairia que nem uma bomba na imprensa...)

O problema também está aí, estarmos à mercê dos mercados.

Mas não há dúvida que iria ajudar em MUITO a situação. Menos 10mil a pagar por ano, ui!

Mas isso leva-nos à questão que já aqui falei, os investidores que já de si são ricos, deviam pensar que têm mais a ganhar se ajudassem os incumpridores em vez de os asfixiar ainda mais.

Tiago Mestre disse...

Seria essa a carta na manga que o Filipe e tu já falaram algures:
Os credores preferem aceitar um adiamento com segurança de que o país está a ser bem conduzido do que ficar já definido que não se pagará nada. Seria um choque, mas os mercados depressa esquecem, desde que as coisas estejam a ser bem geridas.