6 de julho de 2012

Brussels, we have a problem! (Parte 2)

Resposta nossa aos comentários do Vazelios no post Brussells, we have a problem

Vazelios, sobre a tua pergunta:

Não somos todos seres humanos? Não nos poderemos adaptar à cultura dos outros?

Gostava que tivesses razão, mas quem tem razão é a história e os factos que lá estão vertidos.
Se a Europa andou à bulha os séculos todos e Portugal saiu desse filme no século XV à procura de novos mundos, temos que aceitar. Não confirmo, nem desminto, apenas constato, como dizia o João César Monteiro. Oxalá não tivessem guerreado, mas foi o que aconteceu.

Podes sempre acreditar que é possível misturar culturas, mas convêm saber primeiro que culturas são essas. Se for a cultura portuguesa com outras culturas é uma coisa. Se for a cultura alemã com outras culturas é outra coisa.
Quanto mais parecidas e humildes forem, mais se suportarão e menos se odiarão. É como num casal de namorados. Havendo muitas diferenças e pouca humildade dá asneira.

Ontem passei pelo ISPA em Sta Apolónia e vi uma frase fixe: Ganhar consciência do passado ajuda-nos a compreender o futuro.


Sobre pedir a quem mais tem para ajudar quem menos tem, como escrevi no post, considero uma quimera. Não há dinheiro real para cobrir as dívidas todas. O PIB mundial é de 70 triliões e todo o mercado de derivados representa 700 triliões. E mesmo que se fosse buscar àqueles que obtiveram da sociedade ilegalmente ou fraudulentamente muito dinheiro também não chegaria.

Se quiserem destruir estes mercados de dívida e quem beneficia com eles, então temos solução: subam as taxas de juro do BCE e do FED para 5 ou 6%. Os mercados encerram por insolvência e falta de liquidez. É o que eu defendo.
Os bancos iriam à falência? Sim, claro
Os depositantes perderiam o dinheiro lá posto? Sim, claro

Aaah, mas com isso os países ocidentais iriam todos à falência? Pois, mas com os montantes envolvidos, não há forma airosa de despegar a dívida e os défices destes mercados financeiros. Não fui eu que decidi colocar dívida soberana em mercados secundários, onde em apenas num dia os juros passam de 5 para 6%, colocando uma Nação em insolvência do dia para a noite.
O risco, qualquer tipo de risco, é para se medir e para pesar na decisão. Quem não o mede decidirá apenas pelas vantagens imediatas e aparentes. Agora é tarde demais. Toca a sofrer.

Para despegar a sério dos mercados só com défice ZERO.
Os défices que os países geraram foi fruto do crescimento de rúbricas como as pensões e apoios sociais sem qualquer aderência às receitas do Estado.
Os POBRES beneficiaram diretamente com os mercados de dívida porque receberam dinheiro a troco de nada. Os RICOS beneficiaram indiretamente por emprestarem a troco de juros. Quem perdeu? O Estado, que se endividou. Pois, só que o Estado somos todos nós, mas quem o gere? A classe política. Peçam-lhes contas a eles, e não a quem ganhou ou perdeu nas transações.

Ninguém foi forçado a comprar ou a vender. Os políticos é que quiseram que a transação ocorresse mesmo sabendo que não haveria receitas para cobrir. Beneficiaram quem queria dinheiro a troco de nada e quem estava disposto a vendê-lo por um juro. Quem perdeu? O Estado, ou seja, Nós, que não fomos perdidos nem achados no assunto.

As funções de soberania da República custam 13 mil milhões de euros grosso modo se contarmos com:
Polícias, justiça, políticos, parlamento, presidente, ministérios todos à exceção da saúde e educação, exército, marinha, força aérea, autarquias e obras.
É dentro deste bolo que a corrupção mais ocorre, já que é nas compras de bens e serviços pelo Estado aos privados que esse fenómeno atinge o seu apogeu.
Submarinos? Foi aqui
Obras sobrefaturadas nas autarquias? Foi aqui
Obras das pontes em Coimbra e Casas da Música que resvalaram 300%? Foi aqui
Gabinetes de advogados, arquitetos e outras a "mamar" dos ministérios? Foi aqui

PPP's - representam despesas de mil milhões ao ano. Poderão ir até 2,2 mil milhões nos anos piores. Renegociando os contratos que tanto se fala por aí, se se poupar 150 milhões (10%) será muito. Por aqui se percebe o DISPARATE que corre na comunicação social e nos opinion makers em querer usar as PPP's para bode expiatório de tudo quanto seja despesa mal feita.

E agora coloquem tudo isso em perspetiva:

SÓ A DESPESA DA SEGURANÇA SOCIAL SÃO 37 MIL MILHÕES.

E sabem qual é a sua receita? 30 MIL MILHÕES
Todos os anos há um buraco de 7 MIL MILHÕES.
Só o buraco dava para pagar a justiça, polícias, defesa e políticos+parlamento.

E aonde se vão buscar os 7 mil milhões?

Ao bolo das receitas dos impostos do Orçamento de Estado (35 MIL MILHÕES). Dinheiro que vem dos impostos que pagamos e que deveriam servir para pagar as funções de soberania, educação e saúde. Mas não, também servem para pagar pensões, subsídios RSI, desemprego, "políticas ativas de emprego", IEFP's, Enfim, siga para bingo!

JUROS? 8,5 mil milhões este ano e 11,5 mil milhões daqui a 2 anos. É mais do que todos os custos de soberania se descontarmos as obras. E porquê tanto juro? Muita dívida, e porquê? Muito défice, e porquê? Mais despesas do que receitas, e porquê? Porque alguém decidiu dar o que não tinha durante décadas.

SAÚDE? 8,5 mil milhões - Corrupção aqui também há. Comparticipar medicamentos às pessoas (outra vez a ajudar os pobres) promove fraude, e não havendo fiscalização, pagamos nós dos nossos impostos os medicamentos aos pobres e ainda aos que beneficiam fraudulentamente destes mecanismos estatais manipulatórios.

EDUCAÇÃO? 7,6 mil milhões. Aqui é que vai doer a sério, porque muitos politécnicos vão fechar, sobretudo na área das ciências sociais. Universidades idem, e com a nova organização das escolas, muitos professores contratados para as primárias, ciclos e secundárias podem fazer as malas. Muita sala irá ficar vazia.

Tirem as vossas conclusões para onde foi parar o dinheiro.

E se para onde ele foi é possível agora ir lá buscá-lo?

Tiago Mestre

7 comentários:

vazelios disse...

Tiago parabéns pelo teu comentário, é sempre um prazer aprender contigo!

Ás vezes falo mais com o coração, tentando pôr o máximo da cabeça nesses comentários. Obviamente que é utópico pensar que os ricos agora vão compensar a balança de riqueza. Mas não tenho dúvida que iria ajudar, mesmo que não chegue para pagar a conta. Mas porque não hão eles de contribuir com mais se é tão fácil por o povo a contribuir? Ou pelo menos podiam querer ganhar menos, pelo menos em tempos de crise!! É como digo, quando isto estoirar eles não vão ganhar com isso porque não há mais povo para roubar!

Eles já têm mais educação, mais saber, mais oportunidades, mais informação, mais privilégios, mais AMIGOS, mais contactos, para lhes correr melhor a vida. Agora também querem mais dinheiro fraudulento? Querem pagar menos que os outros? Mas porquê? E atenção que sou bem pro-capitalista, mas tudo dentro do que me ensinaram em pequenino, quando me disseram para ser honesto e não mentir! Estes valores que falo é que gostava de os ver outra vez, e eles podiam e deviam ajudar com muito mais! Deviam explicar ao mundo o que se passa, deixar o extend and pretend, o kick the can, epa, por um ponto final!

Ricos e pobres têm culpa, uns por saber e não dizerem, outros por nem tentarem perceber e gostarem de facilidades! Certo!

Bem sei que a maior fatia da despesa são as despesas sociais, e não me canso de espalhar a palavra, que não dá para haver o tão afamado estado social, trabalharmos até aos 65 ou menos e viver até aos 85 ou mais. É só fazer contas. é só ver as pirâmides sociais dos últimos anos para perceber a tendência de mudança da estrutura da população para perceber que é inconcebível.

Mas também não é por acaso que descemos 10 posições na lista de países com menos corrupção, ou que temos cerca de 24 ou 25% de economia paralela. Temos de aprender com os erros!! Ninguém explica nada a ninguém neste país! Até eu tive culpa no cartório quando se calhar pedia mais coisas do que devia quando era novo. Mas temos todos de aprender! Uns não ensinam, outros não querem aprender, e assim continuamos!

enfim, sobre as causas estamos todos de acordo, nunca mais saíamos daqui.

Quanto à convergência de culturas continuo a carregar na mesma tecla, nós fomos à descoberta, sim, temos diferenças, também, mas em tempos fomos dominados por romanos, bárbaros ou árabes e éramos diferentes. E não convergimos todos para uma cultura tão Portuguesa?

Não digo para ser já, nem peço para ser alemão, tenho MUITO orgulho em ser Português, mas gostava era de ter as nossas melhores características, divertidos, bons acolhedores, simpáticos, com a disciplina alemã ou sueca! Com a inteligência dos Suíços ou com a humildade dos Indonésios! Não podemos ser sempre um povo preguiçoso, mentiroso e corrupto para todo o sempre!

Eu tento sempre melhorar quando vejo pessoas diferentes e melhores que eu, e parece-me uma burrice que como humanidade não possamos convergir seja para que caminho for, e tenhamos sempre que divergir uns dos outros!

Estou-me a fazer entender?

lá está, se calhar já estou a sonhar e desculpa lá carregar num ponto se calhar que nem vale a pena falar nele...

Abraço

Anónimo disse...

Mas as fundações e os institutos?? que é feito do corte nestas areas...

Tiago Mestre disse...

Vazelios, a sensação que eu tenho é que os ricos estão pouco disponíveis para colaborar porque consideram que o dinheiro lhes custou tanto, mas tanto a ganhar que seria uma tremenda injustiça contribuir ainda mais. Mesmo aqueles que o obtiveram ilegitimamente, consideram que sempre que lutaram por ele e que o merecem.
Quem possui propriedades, coisas, bens, etc, defende-as ao máximo porque são suas. É o direito de possuir que ninguém quer ver revogado. Mesmo os pobres que possuem pouca coisa defendem-na com unhas e dentes.

Para responder ao anónimo, um dia coloco um post com as fundações e os institutos, mas estão todos dentro dos ministérios que falei. O ministério da economia e da agricultura têm bastantes, mas pesam pouco no valor global da despesa.
É que são tantos, tantos, que uma pessoa até se perde. Mas já pensei nisso e quero fazê-lo

Ricciardi disse...

Certo Tiago. Agora vejamos a coisa sob outra perspectiva. O saldo primário orçamental é superavitário. Isto significa que o saldo final se torna deficitário com a inclusão dos juros do serviço da divida.
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O que quero dizer é que a «exploração» está equilibrada. Neste sentido o problema está no passado. No excesso de endividamento. E é este problema que devemos resolver. No limite se cancelassemos o pagamento da divida não precisariamos de financiar o defice. Mas nao é isto que advogo, oviamente, embora em certos casos que cheiram a corrupção, seria lindo anular as dividas inerentes e assacalas aos corruptos.
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Se o caro Tiago reparar bem e comparar os custos em que o estado portugues incorre, na saude, na educação, nas pensoes, são imensamente mais baixos do que a generalidade dos paises desenvolvidos. A titulo de exemplo, enquanto a alemanha tem custos per capita na saude na ordem dos 4.700 usd, em Portugal esses custos são de cerca 2.300 usd.Nos Eua são de 8.000 usd. Em França são de 4.000 usd.
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Portugal gasta menos de metade e promove a mesma qualidade de saude de todos os outros. Os indicadores macro de saude são bons e em linha com os melhores.
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Por outro lado os custos de contexto em Portugal são praticamente iguais à alemanha ou à frança.
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Isto significa que não é possivel reduzir a despesa senão numa pequena medida, no desperdicio que ainda vai havendo. Mas são peaneats. Os liberais recorrem aos salarios. Nada mais errado como se vê pela execução orçamental do mes passado.
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O problema do país é mesmo do lado das receitas que os privados (não)geram. Não há dimensão empresarial suficiente. Massa critica.
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Há duas hipoteses. Tornarmo-nos terceiro mundistas, isto é, abdicar de tudo. De todas as despesas. Fechar hospitais, escolas, mandar os pensionistas às favas, esquecer a manutenção das estradas etc(e tentar aguentar politicamente a multidão em desespero)... ou em alternativa a isto fazer alguma coisa para melhorar a actividade economico-empresarial.
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Ora, se optarmos pela segunda, muita coisa pode ser feita. Todas elas implicam negociação com os credores. Todas. Porque já vamos tarde. O Euro deu-nos a ilusão de bem estar por demasiado tempo.
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Rb

Ricciardi disse...

E porquê?
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Porque não existirá investimento privado, estrangeiro ou nacional, se a carga de impostos se mantiver a este nivel. Pelo contrario. A ideia seria negociar um regime excepcional fiscal com a troika que motivasse a atracção de investimento e o empreenderismo.
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Ou seja, manter a disciplina no lado da despesa e permitir um abaixamento forte nas receitas de impostos directos contrabalanceando as mesmas com impostos indirectos.
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Sou até da opinião de que se deveria abolir os impostos directos colocando a receita de impostos sobre o consumo efectivo.
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A consequencia destas medidas seriam imediatas. As sedes da empresas psi20 regressariam a Portugal. Captariamos mais investimento estrangeiro. Os ganhos fiscais seriam obvios. Se a isto fosse previsto um excepção adicional relativa à fiscalidade sobre as transações com o mercado externo então teriamos o problema resolvido mais rapidamente.
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Mas mesmo que os efeitos nao fossem imediatos, porque nunca são, os credores tem interesse em esperar mais tempo.
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Eu como credor do estado, nesta fase do campeonato, tenho mais interesse em esperar e abdicar de alguma rentabilidade, do que a perspectiva de ver um país a definhar e vir a não receber o capital que investi, como na grécia.
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É uma questão de bom senso, e o FMI e a UE, tem demonstrado abertura para negociação. Falta empenho do aluno ppc.
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Eu sei que a alemanha tem vindo a ganhar com isto. Muito dinheiro. A prova disso está nas tacas negativas que tem na colocação de Bonds. Mas está na altura de enfrentar estes interesses. E enfrentar nao significa hostilizar, mas antes reunir esforços com os parceiros como fez o sr. Monti de Italia.
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De outra forma é um camilho cujo trilho levará inexoravelmente ao abismo.
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É bom de ver. O governo agora vai taxar os privados e os publicos em face da determinação do TC. Nada mais errado. Será o golpe final e fatal na economia.
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Rb

José T. de Sousa disse...

Artigo interessante sem dúvida. Quais são as suas fontes para os números da despesa?

Tiago Mestre disse...

Caro José T. de Sousa, recomendo-te o site da DGO onde está disponível o orçamento de Estado para 2012. A leitura do mesmo não é totalmente acessível, pelo que se tiveres dúvidas ou quiseres confrontar os números, escreve-me para tiagomestr@gmail.com ou comenta neste post. Não indiquei a fonte porque já o tinha feito num post anterior:
http://contascaseiras.blogspot.pt/2012/06/ok-e-preciso-cortar-despesa-mas-aonde.html

Hiperligação da DGO:
http://www.dgo.pt/politicaorcamental/Paginas/OEpagina.aspx?Ano=2012&TipoOE=Or%C3%A7amento%20Estado%20Aprovado&TipoDocumentos=Lei%20/%20Mapas%20Lei%20/%20Relat%C3%B3rio