15 de outubro de 2012

Política é pensar a cabeça dos outros

Não costumo muito usar aquela tática de nos basearmos em grandes frases de certos pensadores só para reforçar os nossos argumentos, até porque há grandes pensadores que defendem ideias às vezes totalmente opostas, mas desta vez abrimos uma exceção pela luminosidade da ideia.

A frase é de Bertold Brecht, poeta e dramaturgo alemão, e foi encontrada num livro de Walter Benjamim, também ele dramaturgo e alemão, que está a ser lido cá em casa:

"Talvez o decisivo na política não seja o pensamento individual, mas sim a arte de pensar a cabeça dos outros."

Acho a frase interessante porque considero esta abordagem uma maneira eficaz de definir uma problemática e tentar compreendê-la. E a problemática que aqui trago é esta:

Que regime político serve melhor Portugal e os portugueses?

Já em posts anteriores "denunciei" a minha incapacidade em responder a esta pergunta. O Luis M. inclusivamente deduziu que eu estaria a favor de um regime mais a puxar para o ditatorial, mas não é esse o caso.
A pergunta tem que ser feita de forma aberta e despudorada, e a tentativa de resposta ainda mais.

Mas para responder é preciso primeiro formular duas perguntas prévias:

1. Quais os regimes políticos que há?
2. Como podemos caracterizar a nossa cultura e a maneira de ser do português?

Se a primeira pergunta requer "apenas" estudo intenso e um pouco de criatividade, já a segunda não é assim.
O dilema aqui é perceber mesmo a cultura portuguesa, ou seja, ter a arte de perceber a cabeça dos outros.

Talvez o último grande pensador da cultura portuguesa tenha sido Agostinho da Silva. O Eduardo Lourenço ainda por cá anda, mas sobre este tipo de problemática não o ouço falar.
De resto, não vejo, nem ouço nem leio ninguém a abordar este assunto tão complexo.

E segundo penso, sem dar uma resposta satisfatória a esta pergunta, dificilmente conseguiremos responder à primeira pergunta de todas, aquela que define a nossa problemática.

O que se tem feito ao longo da nossa história é simplesmente mandar abaixo o regime anterior pelos defeitos que exibe e montar um novo regime, ou recauchutado, na esperança que sirva.

E o resultado está à vista de todos nós: andamos sucessivamente a bater com a cabeça na parede.
Sempre a fugir de um lugar na esperança de ir para outro melhor, e depois, ooops, afinal já não é tão bom assim.
Como não se estuda com cuidado o objeto do problema, as soluções são sempre remediadas e atabalhoadas, gerando defensores igualmente atabalhoados que agridem e ofendem verbalmente os defensores de ideias opostas e não deixando que a solução apareça da forma mais natural possível, ou seja, de acordo com as inspirações genuínas do povo.
O sistema político deve existir para nos servir, mas se este não percebe nem deseja perceber o que somos e porque somos assim, como pode bater a bota com a perdigota?

Exorto a todos os leitores que antes de defenderem as suas ideologias políticas reflitam um pouco sobre a sua adequação ao povo visado, ou seja, à maneira de ser do português.


O contexto em que a frase de Brecht foi escrita é forte, porque ambos os dramaturgos já se tinham "virado" para o comunismo, tiveram que fugir do regime nazi, e a frase aparece como tentativa de explicação do raciocínio de Hitler, que permitia aos seus líderes políticos discursarem e exercerem a sua sedução política junto do povo, mas nos momentos cruciais, era ele que mandava no espectáculo porque considerava que os seus pensamentos eram menos imperfeitos do que os deles !

Tiago Mestre

6 comentários:

vazelios disse...

Para mim é simples mas talvez utópico.

O regime ideal é a Democracia, até nos mesmos moldes.

A única diferença é que a constituição se devia central à volta de 2 pilares:

LIBERDADE
RESPONSABILIDADE

A liberdade de cada um acaba onde interfere na liberdade do outro e,

Responsabilidade - Qualquer politico que gastasse mais do que défice 0-1% era imediatamente destituido do cargo.

Pôr isto assim claro que é infantil, mas a ideia base devia ser essa. Depois trabalhava-se as entrelinhas.

vazelios disse...

"Centrar à volta..."

David Seraos disse...

Vazelios isso é bom, mas será que a maioria dos portugueses concorda com isso. Todos os que leem estes blog acredito que sim, que concordem. Eu sou um deles que concordo.

Tenho lido alguns posts sobre a tradição (muitos do Pedro Arroja, que acho que fala muito bem do tema), mas só ouve dois períodos em que as contas nacionais estiveram boas, podemos assim dizer, mas foi na altura do Marques de Pombal e de Salazar, podemos dizer autoritarismo.
E a "nossa" tradição é de "esperarmos" que o Estado no indique o que fazer no geral, muito de comunidade, estar tudo bem para todos, podemos assim dizer.
E muita gente "gosta" de se sentir salvaguardada pelo Estado Social, e problema disso é que depois surge toda a desculpa para o socialismo tão enraizado.

Outra facto importante é Portugal ser "considerado" um país de gente preguiçosa e que não quer trabalhar. E os imigrantes Portugueses espalhados pelo mundo fora são considerados optimos trabalhadores. Era algo bom de pensar nisto também. Será que fora do seu espaço de conforto os Portugueses são melhores ou será só um problema de "estrutura organizativa" de Portugal?

A 2ª pergunta, o qual o melhor "regime" não sei.

Mas espero que o proximo "passo" não seja "ditatorial", e acho que agora fora da tradição seria bom olhar para o Oriente, que soube "aproveitar" alguns boas ideias do Ocidente, com certeza que mesmo assim esses países que "aprenderam" só algumas coisas com Ocidente não sejam o Paraíso, nem a Perfeição. Mas pedir isso a qualquer sociedade é irrealista. Infelizmente alguns pensam que é possivel, e promente isso.

Fernando Ferreira disse...

O melhor regime politico e' NENHUM regime politico.
Queima-se o cerebro a tentar reformar este ou aquele sistema politico (colectivista), sem perceber-se que o problema esta exactamente no colectivismo.
E' o mesmo que termos um obeso morbido que percebe que esta mal e que acha que vai ficar bem se deixar de comer hamburgers e passar a comer sandes de entremeada. Depois percebe que nao resulta e volta-se para as sandes de coiratos. Depois para as sandes de torresmos. O problema e' que nunca entende que tem de deixar as gorduras.

Numa sociedade livre e nao coercivamente colectivista, cada um podia viver como quiser e organizar-se com os outros como quiser. Ate os comunistas seriam livres de comprarem um terreno e criarem uma sociedade comunista. A unica condicao e' que nao forcassem quem nao quer ser comunista a se-lo. Poderiam todos trabalhar para um bolo e distribuir o produto equitativamente, se o quisessem. Claro que sabemos que esta sociedade nao iria durar muito, mas o ponto importante e' que poderiam viver como desejassem.

Nao sei como e' que isto vai acabar, nem quando. Mas que este sistema monetario-financeiro crony-capitalista esta nos seus ultimos dias, isso esta. O que vai surgir depois, nao faco a minima ideia.

Filipe Silva disse...

O Fernando disse tudo, acho que é de uma arrogância muito grande alguém determinar que sistema deve vigorar, se ditadura ou democracia, isso pressupõe que alguém teria a capacidade de ver para além do que vê o comum do mortal.

Seja democracia, seja ditadura, um grupo ou pessoa pensa ter a capacidade de escolher pelos outros o que é melhor para todos.

Democracia é um sistema vil como vemos hoje, uns ganham eleições ficam com o poder todo, orientam-se a eles e aos amigos, perdem as eleições e fica a conta para pagar por pessoas que nada tiveram a ver com o que foi feito.

O nazismo chegou ao poder por via democrática, e grande parte das alterações que fez foi via democrática.


Portugal pode perfeitamente acabar, a democracia funcionaria melhor a nível de cidades estado, seria muito mais directa e muito melhor para a escolha individual, por exemplo um ser humano poderia escolher se queria mais ou menos impostos, mais ou menos despesa pública, etc...

Fernando Ferreira disse...

Filipe,
sem duvida que a democracia funcionaria muito muito melhor ao nivel de cidades estado. Neste caso, como o Filipe diz, um ser humano poderia escolher se queria mais ou menos impostos, mais ou menos despesa publica, etc.
E como ficaria aquele que nao quer zero impostos e, consequentemente, zero despesa publica?
A democracia descentralizada seria, sem duvida, melhor da que a centralizada, a democracia do mega-estado que os federalistas desejam para a UE, mas continuaria a ser "um mal menor" e um mal menor continua a ser um mal, continua a ser uma forma de colectivismo.
Enquanto continuar-se a pensar que ha assuntos que tem de ser "decididos em conjunto" e que o que a maioria achar e', necessariamente, certo e justo, nada vai mudar.
Cumprimentos!