30 de setembro de 2011

Contas públicas portuguesas do 1º Semestre 2011

Caros Leitores e Leitoras, ficámos hoje a saber os resultados do andamento das contas públicas portuguesas para o 1º Semestre de 2011.


O Estado, em seis meses, teve um prejuízo (diferença entre receitas e despesas) de 7 mil milhões de euros. Significa um défice em função do PIB de 8,3%. Este valor está muito longe do que se pretende para o final do ano: 5,9% do PIB. E nem de propósito, ainda ontem publicámos um post acerca das declarações do Dr. António Borges na revista exame, em que já desconfiávamos que o teor das mesmas sugeriam discretamente que o FMI estaria a descartar-se de responsabilidades do potencial falhanço do programa de austeridade caso o PIB de Portugal não crescesse.


No segundo semestre (já passaram 3 meses, falta metade) seremos obrigados a compensar este acréscimo, ou seja, não poderemos ultrapassar um défice semestral de 3,5% do PIB para que tudo somado não exceda os 5,9% do PIB no final do ano.



Nas condições actuais, atingir 5,9% do PIB até Dezembro é tecnicamente impossível, porque os portugueses aperceberam-se no dia 1 Julho, quando souberam que metade do subsídio de Natal seria cortado, que teriam que travar a fundo no consumo. Desde aí que essa queda no consumo tem influenciado pela negativa a captação de receitas pelo Estado - soube-se ontem que a queda de venda de combustíveis em Portugal foi a maior em toda a década - o que significa que os valores do IVA e do ISP estão em queda, de certeza absoluta. 



Para compensar esta falta de receita que estava orçamentada, o Estado terá que voltar a incorporar mais receitas extraordinárias ou reduções na despesa, a saber:

Mais privatizações (se ainda as houver);
Aumentar mais os impostos;
Reduzir salários, pensões e apoios sociais;
Incorporar Fundos de Pensões na Segurança social;
Outras criatividades que a nossa imaginação não alcança.



Sobre o assunto dos Fundos de Pensões, faremos um outro post para explicar os contornos destas operações de transferências.. a não perder!


E tudo isto para explicar o quê? Que os políticos e a troika partiram de premissas totalmente erradas quando elaboraram o plano: julgaram que reduzindo a despesa do Estado e aumentando os impostos, a economia não sofreria muito e conseguiria crescer o suficiente para acomodar todas estas medidas e começar a pagar a dívida (daí a tal importância do crescimento das exportações). Já explicámos pormenorizadamente as razões que comprometem este plano da troika de chegar a bom porto nos posts de 18 Julho, 26 Setembro e de ontem (29 Setembro) acerca da entrevista do Dr. António Borges do FMI.


Os meses passam depressa e os agentes políticos, talvez por impreparação ou gestão de calendário político, insistem em errar permanentemente nas estimativas orçamentais que propõe aos portugueses. Percebe-se agora que é preciso um milagre para cumprir o acordo, com dimensão semelhante ou maior àquele que ocorreu na Cova da Piedade a 13 Maio 1917 quando a 1ª República, o seu défice e a sua dívida viviam momentos muito conturbados.


Como cidadãos, nada mais nos entristece e preocupa do que os momentos que estamos a viver, mas para compreender a realidade, é preciso encará-la tal e qual como ela é. O que se deduz de tudo isto é que a economia portuguesa (quem trabalha no privado e faz descontos) não tem força colectiva suficiente para aguentar este embate que nos é exigido.

No 1º Post que publicámos aqui no Contas, a 26 de Dezembro de 2010 !, previmos que Portugal teria nesta década um crescimento negativo anual médio de -0,77%. Mas com os meses a passar, e com a situação económica portuguesa totalmente fora de controlo, esta previsão, já de si catastrófica, parecerá optimista daqui a uns tempos. Se contabilizarmos para 2011 e 2012 recessões a rondar os -2,5%, começamos muito mal os 2 primeiros anos. Oxalá estejamos enganados aqui no Contas.


Tiago Mestre

29 de setembro de 2011

Com estas explicações deixo de receber lições do FMI

Pretendemos com este post informar e decalcar os nossos prezados leitores  excertos de uma entrevista que o Director do Departamento Europeu do Fundo Monetário Internacional concedeu à revista Exame:


Na dita entrevista, António Borges refere que se Portugal quiser que o plano de austeridade funcione, terá que ver o seu PIB crescer... e para tal deverá apoiar-se nas exportações... e para tal deverá baixar a Taxa Social Única... e para tal terá que aumentar o IVA para compensar...


Para quem não teve o prazer de ler o nosso post de 26 Setembro, volto a recordar a fórmula do Produto Interno Bruto:
PIB = Consumo Privado + Investimento + Consumo Público + Exportações - Importações

Não é preciso ser um cientista para perceber que:

1. Quando o Estado português reduz despesa, reduz o Consumo Público (compras) 

2. Quando o Estado português aumenta impostos reduz o Consumo Privado (menor poder de compra)

Infelizmente não há volta a dar, e o sr. Borges quer-nos fazer acreditar que por via das exportações teremos que, não só compensar esta quebra do consumo como ainda superá-la para que o PIB cresça... e para que tal ocorra, sugere a redução da Taxa Social Única, mas como o Estado não tem dinheiro para acomodar essa redução na receita, terá que subir mais o IVA, reduzindo ainda mais a parcela do Consumo Privado. Salva-se a parcela das importações, que certamente irá cair e assim sempre ajuda alguma coisa.


Devem haver muitas consultas de Psiquiatria bem mais lúcidas do que este exercício de lógica económica.


Aqui no blog Contas Caseiras temos a perfeita noção que as medidas de austeridade trarão mais recessão, e isso é mau só por si, mas o equilíbrio entre receitas e despesas do Estado teria que ser inevitavelmente executado. O que não aceitamos é que quem prescreveu estas medidas - FMI e restantes da troika - venha agora dizer que sem crescimento o plano não funcionará. Se há coisa que o plano de austeridade irá provocar é falta de crescimento. Não é coerente!

Conspiro que o FMI já esteja a preparar terreno para se descartar de responsabilidades quando o plano falhar. Estão a aprender muito com o caso grego.

Ainda sobre a entrevista, o sr. Borges refere que Portugal deverá tomar medidas que o façam aproximar da Irlanda e distanciar da Grécia.
Da análise que fizemos aqui no Contas, as causas que nos levaram a pedir ajuda à troika aproximam-nos muito mais da Grécia do que da Irlanda.

Semelhanças entre Portugal e Grécia:

1. Défices públicos bem acima dos 3% durante a década 2000-2010;
2. Despesas correntes a serem financiadas com crédito vindo do exterior;
3. Crescimento da dívida pública acima dos 7-8% ao ano;
4. Desorçamentação maciça para esconder despesas e dívidas ao perímetro orçamental;
5. Carga Fiscal bastante elevada sobre transacções de bens (IVA) e lucros das empresas (IRC);
6. Sector empresarial pouco exportador, maioritariamente serviços e virado para o grande cliente Estado.


As razões do pedido de ajuda da Irlanda prendem-se muito mais com a dimensão do sector bancário doméstico e os investimentos ruinosos em que este apostou. A economia irlandesa não ficou imune a tal colapso, e o Estado, em desespero, assumiu no ano fiscal de 2010 os activos tóxicos dos bancos e os respectivos encargos de financiamento.

O Sr. Borges lança-nos o desafio, fica-lhe bem, mas o diagnóstico presumo que ele já o saiba de cor: as diferenças que nos separam da Irlanda são tão evidentes como as semelhanças que nos aproximam da Grécia. 

Tiago Mestre

Guerras de Informação - Guerras de Poder (Parte 2)

Pretendemos neste post informar os nosso prezados leitores sobre mais um caso de plantação de notícias, ou neste caso, da não plantação de notícias:

Ontem de tarde o presidente da Reserva Federal Norte-Americana, Ben Bernanke, deu um discurso em que realçou o comportamento negativo que a economia americana já demonstra, e de como o futuro da mesma remete para preocupações ainda maiores.
Conhecendo a reputação de Ben Bernanke e da cobertura mediática que lhe é oferecida, declarações desta natureza seriam manchete nas grandes publicações online, como a CNBC, Bloomberg ou Financial Times. Contudo, tal não aconteceu, nem mesmo uma pequena hiperligação escondida no canto da página. A omissão noticiosa foi tal que quem não estivesse atento nem saberia que o senhor tinha falado.

Desconfiei que algo se tinha passado, porque no índice bolsista Dow Jones, este seguia a valer mais de 200 pontos, tendo acabado por perder todos os ganhos numa súbita descida até ao fecho da sessão.
Só hoje de manhã reparei numa notícia, discreta por sinal, no jornal Der Spiegel, que citava o discurso de Ben Bernanke, dando destaque às preocupações do Presidente da Reserva Federal sobre o futuro economia americana.

Finalmente a história fazia sentido, e assim se percebe o motivo que levou as edições online dos canais noticiosos da especialidade a não informar sobre um assunto da maior importância: não assustar ainda mais os mercados.
É que pela primeira vez desde 2008, o Presidente da Reserva Federal admite que a economia americana deixou de crescer e promete não ficar por aqui.
A guerra continua..


Para se tentar compreender a gravidade das palavras de ben Bernanke, eis a notícia integral do Der Spiegel com tradução do Google Translate !!! :

"Ben Bernanke fala claramente: O chefe do banco central dos EUA considera a situação no mercado de trabalho doméstico como precária como sempre desde a Segunda Guerra Mundial. Muitas pessoas por muito tempo sem um trabalho - agora o Congresso deve agir U. S..

Washington - A situação no mercado de trabalho dos EUA atingiu o nível de uma "crise nacional" - de forma tão clara que tem presidente do Federal Reserve Ben Bernanke , disse hoje: Cerca de 45 por cento dos desempregados em os EUA tinham pelo menos seis meses sem emprego, Bernanke, disse na quarta-feira à noite (hora local) após um discurso em Cleveland. Então situação precária desde a Segunda Guerra Mundial não tinha voltado.


Declaração de Bernanke tem um impacto enorme: O chefe da Reserva Federal (Fed) é mais um homem de sons calmo - quando ele tão claramente expressa, lhe parece ser mais sério do que nunca com a economia dos EUA.Na semana passada a principal autoridade monetária antes de "riscos de deterioração significativa das perspectivas económicas, incluindo as pressões nos mercados financeiros globais", alertou - e, novamente, as medidas tomadas para estimular a economia dos EUA lento. O Fed leva até meados do próximo ano, de US $ 400 bilhões em mão a fim de adquirir obrigações de longo prazo."Twist Operação" é reduzir as taxas de juro de longo prazo.

O presidente do Fed não está fechada em caso de queda da inflação mais medidas de política monetária não convencional. "Se cair a inflação ou as expectativas de inflação em um nível baixo, que seria algo que devemos reagir, porque não queremos que a deflação", disse Bernanke. O Fed está observando a situação muito de perto.
Conselho urgente para os países industrializados
Mas agora Bernanke vê a política de obrigação: Ele pediu que os membros do Congresso para fazer mais na luta contra o desemprego de longa duração. Além disso, a falta de disciplina fiscal e o mercado imobiliário foi as questões mais prementes que o país enfrenta.
Declarações de Bernanke é provável presidente dos EUA Barack Obama não gosta. Obama foi mais recentemente os europeus principalmente a culpa pela crise atual dado, no entanto, não quero participar disso.
Mas Bernanke também alguns conselhos para todos os países desenvolvidos esse problema: Você deve ser a mercados emergentes olhar mais preciso. Uma vez que existe sobre a disciplina orçamental de aprender muito."


Tiago Mestre

28 de setembro de 2011

Eurobonds - No More

Pretendemos com este post fazer um pequeno exercício de prospectiva sobre uma eventual aplicação das Eurobonds como mecanismo europeu de financiamento das dívidas dos países que compõe a Zona Euro.

Antes de efectuarmos o exercício sobre que pode vir a acontecer, há obstáculos que é necessário ultrapassar, dado o actual enquadramento da UE, a saber:

1.1 Tribunal Constitucional alemão já disse que não aprovará uma medida desta natureza.
1.2 Alemanha terá que fazer um referendo popular de alteração à constituição.
1.3 É preciso que o referendo seja votado favoravelmente;
1.4 Os restantes países da UE terão que aprovar este novo mecanismo, com ou sem referendo popular, dependendo das suas próprias leis;
1.5 Presumo que seja necessário alterar o Tratado de Lisboa, já que este não inclui a utilização de mecanismos desta natureza.

Fazer passar todas estas alterações já de si é tarefa de gigante, sobretudo numa altura em que as divergências ideológicas e culturais entre os vários países começam a reaparecer.

Mas mesmo que tal milagre ocorresse, a procissão só ainda iria no adro.
Eis o exercício de prospectiva:


2.1. A emissão das Eurobonds inicia-se com uma notação de AAA, apoiada pelos países que possuem essa mesma notação;

2.2. Os países começam a "lutar" pelo dinheiro, de acordo com as suas necessidades próprias de financiamento;
2.3. Quanto mais os países gastarem internamente, mais dinheiro pedirão à Europa, criando fenómenos de países mais privilegiados do que outros na captação do dinheiro;
2.4. O controlo das contas públicas de cada país será cada vez menos rigoroso, já que quanto mais prejuízo mostrarem, mais financiamento exigirão à UE, sem se preocuparem com a dívida que está a crescer, já que esta é de "todos";
2.5. Começa-se a perceber que as Eurobonds serão cada vez mais usadas para os países que menos cumprem, abrindo a discussão se a notação se deverá manter em AAA;
2.6. Agências de notação financeira ameaçarão com outlooks negativos e descidas de rating da dívida Eurobond;
2.7 O custo de financiamento começará a subir gradualmente, reflectindo a desconfiança dos credores na boa gestão desse dinheiro;
2.8 Com o agravamento da situação, a notação financeira será reduzida gradualmente;
2.9 As instituições europeias exigirão aos países que gastem menos, todos sem excepção, abrindo clivagens dentro da própria UE;
2.10 Os custos de financiamento atingirão níveis que serão muito superiores aos custos que certos países tinham antes da emissão das Eurobonds, como a Alemanha;
2.11 Países mais cumpridores pedirão tratamento diferenciado à UE, nomeadamente exigirão descontos na taxa de juro.
2.xx ... aceitam-se contribuições dos nossos leitores ...

Poderíamos continuar o resto do dia... até chegarmos à conclusão que este mecanismo apenas agravaria a própria União e a sua estabilidade, promovendo a sua
 desintegração, o regresso da proibição de circulação livre de pessoas e bens, moedas de cada país a competirem entre si, economias profundamente deprimidas e, em caso de total colapso entre as diplomacias de cada país, um eventual conflito militar. Esta última hipótese não me atrevo a desenvolver pela complexidade da mesma e pela dificuldade pessoal em digerir tal cenário.
O que prevemos é que um cenário de Eurobonds está condenado ao fracasso logo à partida, não pela concepção do mecanismo em si, mas pelas enormes diferenças históricas, ideológicas, culturais e económicas que todos tão bem sabemos que existem nesta velha Europa.



Tiago Mestre

3º Post: A energia (renovável) somos nós

Pretendemos neste post actualizar a questão do aumento da tarifa da electricidade para 2011.
Numa revelação surpreendente do Ministro da Economia ontem, fomos informados que o aumento previsto de 30% pelo anterior executivo já não fará parte da nova proposta deste executivo, mas sim um aumento bem menor.

Como tão bem sabemos, no fim serão sempre os contribuintes a pagar a dívida, e só por isso temos o direito natural de saber qual o plano para liquidar o que está para trás, o que ficará em falta e como iremos pagar o que aí vem. 
Fazer a apologia de que a factura não terá um aumento de 30% mas menos, justificando que essa redução se deve ao empenho do executivo em encontrar soluções que aliviem esse aumento, como se tratasse de um paço de magia, já não serve. É preciso contar a história toda, mostrando nobreza de carácter e princípios morais bem definidos. Contamos com o Ministro da Economia para esta tarefa.


Tiago Mestre

Uma nova factura de electricidade para a Grécia

Pretendemos neste post esclarecer os nossos prezados leitores acerca do mecanismo de implementação que o governo grego aplicou aos gregos para a nova taxa sobre o imobiliário.


Ficou ontem aprovado no parlamento grego (155 a favor 150 contra) o novo aumento de impostos para a população daquele país. Sendo o sucessivo aumento de impostos já de si um enorme golpe para a retoma do crescimento  do país, como demonstrámos no post de 26 de Setembro, o que esta medida trás de novidade é o modo como será implementada.


Sendo os gregos um povo que, tanto quanto sabemos, é ardiloso em encontrar mecanismos para fugir ao fisco, o que não é de espantar, já que a carga fiscal elevada pouco tem a ver com os serviços e bens que o Estado disponibiliza às populações, foi necessário arranjar um mecanismo que prevenisse a fuga a este novo imposto. E como? Introduzindo-o na factura da electricidade. Não é original. Em Portugal também já pagamos serviços através da factura que pouco dizem respeito à produção, transporte e fornecimento de electricidade.


É fácil compreender o raciocínio dos legisladores gregos: como a electricidade é um bem essencial só se deixa de pagar em último recurso, e por essa via, toca de enfiar lá impostos pelo meio para garantir a eficácia da medida.


Mas numa perspectiva prática, ocorre-me a seguinte pergunta: como se cobrará o imposto sobre todos aqueles terrenos, sobretudo rústicos, ou até urbanos, que por esta ou aquela razão não possuem a baixada de electricidade? É caso para inferir que os senhorios de terras que não possuem ligação à rede eléctrica estarão em clara vantagem. Mas na urgência das circunstâncias, esse assunto para agora não interessa. O que interessa é cobrar, custe o que custar.


Verdadeiramente o que está aqui em causa é que, por desespero dos governantes, qualquer meio se legitima para atingir um qualquer fim desejado. Manipular a cobrança de um imposto recorrendo à factura da electricidade toca, mais uma vez, nos píncaros da imoralidade, a somar a todos os lapsos e injustiças que o legislador não vislumbrou, mas que certamente aparecerão no futuro.
Já estou a imaginar os gregos a comprar painéis fotovoltaicos e mini-eólicas para depois dar baixa na EDP lá do sítio, ou então em prédios e casas geminadas usarem apenas uma baixada geral e depois "derivarem" para outras fracções. Enfim, certamente que a imaginação de 10 milhões de gregos será suficiente para contornar esta lei, o que não deixa de ter um fundo de justiça. 
Rearranjando um ditado popular: Quem faz o que não deve, arrisca-se a receber o que não quer.


Tiago Mestre

27 de setembro de 2011

Guerras de Informação - Guerras de Poder

Pretendemos neste posto informar os nosso prezados leitores de um fenómeno que já tínhamos constatado no passado, mas que desconfiávamos se seria verdade: a manipulação de informação e a "plantação" de notícias nos meios de comunicação para influenciar os mercados de valores de todo o planeta:

1ª Notícia - e que serviu de empurrão para a abertura positiva na segunda-feira das bolsas na Europa e de seguida nos EUA:
O Jornalista sénior de economia do canal CNBC - Steve Liesman - ventilou a ideia, após o encerramento do Fórum Anual do FMI no Domingo, de que os líderes políticos europeus estariam a preparar um reforço brutal do Fundo Europeu EFSF actualmente em vigor para valores acima de 2 biliões de euros (ou 2,2 triliões de euros na linguagem financeira dos EUA), recorrendo a um veículo financeiro baseado no Banco Europeu de Investimento que se financiará junto do Banco Central Europeu para emprestar ao EFSF e, por esta via, aos países com dificuldade em se financiarem no mercado, como a Espanha e Itália. Enfim, uma criatividade financeira que dificilmente se compreende e pior se explica, porque fica-se sem perceber quem carregará o peso desta alavancagem do fundo: se serão os contribuintes dos países com notação AAA ou se será o BCE. Esta notícia foi amplificada em todo o mundo e realmente a ideia pegou. As bolsas na segunda-feira e hoje, terça-feira, estão em maré positiva, com ganhos bem acima de 2 e 3%.

E agora os desmentidos...

2ª Notícia - Terça-feira de Manhã
Ministro das Finanças Alemão - Wolfgang Schaeuble - numa palestra em Berlim, desmente que o reforço do EFSF esteja em cima da mesa. Reafirma a necessidade dos países incumpridores em prosseguirem com as medidas de austeridade e consolidação orçamental.

3ª Notícia - Terça-feira de Tarde
O Banco Europeu de Investimento desmente que esteja envolvido em qualquer participação no veículo financeiro especial para resgatar países em concomitância com o EFSF. Reforça a sua vocação de banco que apoia projectos de investimento viáveis.

E perguntamos nós, cidadãos ingénuos mas preocupados: 
Mas quem está a dizer verdade e quem está a dizer mentira? O jornalista norte-americano ou os dirigentes europeus? Terá sido mera especulação de algum dirigente europeu ou americano que confidenciou ao jornalista no Domingo uma potencial/eventual/remota hipótese de alargamento do EFSF, e este lhe tenha dado demasiado crédito?

Nunca chegaremos a saber. Mas isto sabemos: o impacto que estas informações têm é de dimensão planetária.

E tanto quanto sabemos, os algoritmos que correm nos computadores de empresas que  apostam nas bolsas estão permanentemente a efectuar buscas em sítios de informação financeira na Internet para poderem colocar ordens de compra e de venda nas bolsas antes de toda a gente. Este mecanismo denomina-se High Frequency Trading (HFT).

Estão criadas as condições para que os rumores se instalem e que certos investidores "invistam" na plantação de notícias para influenciarem os mercados no sentido que mais desejam. Parece-me inevitável.

Tiago Mestre

26 de setembro de 2011

PIB de Portugal revisto para 2012: de -1,5% para -2,5%

Pretendemos neste post divulgar uma informação que foi veiculada hoje de manhã na comunicação social. Por estranho que pareça, ao fim da manhã esta notícia já não constava nos meios de comunicação: 

O Ministro das finanças avançou nos Estados Unidos da América que o governo português terá que rever o crescimento do PIB para 2012, já que o valor previsto anteriormente de -1,5% poderá ser afinal de -2,5%. Esta alteração para muito pior significa que as receitas ordinárias que o governo esperava alcançar não serão obtidas, exigindo novas medidas de austeridade:
ou do lado da redução da despesa;
ou do lado do aumento extraordinário de impostos;
ou ambos.

Achamos por bem informar os nossos leitores desta notícia porque ela revela a incapacidade e a impossibilidade dos governos reduzirem a presença do Estado sem ter efeitos negativos na economia e no crescimento do PIB.

Publicámos neste blog um post a 18 Julho que já reflectia sobre esta incapacidade dos governos em corrigir défices sem ter impacto no PIB, mas que teimosamente a classe política continuava a insistir que era possível. Verificamos pela notícia de hoje que há 2 meses a classe política ou não foi séria ou foi demasiado optimista. 

Para desmistificar esta questão apresentamos abaixo as fórmulas das duas grandezas em causa: Défice público e PIB.

Défice Público em função do PIB = (Receitas do Estado - Despesas do Estado) / PIB

Esta fórmula diz-nos que quanto maior for o PIB, menor é o défice. E diz-nos também que se as receitas forem superiores às despesas, o défice passa a ser positivo, e denomina-se "superavit".

Produto Interno Bruto = Consumo Privado + Investimento + Consumo Público + Exportações - Importações

Esta fórmula diz-nos que para a contabilização do PIB, apenas as importações subtraem ao valor, tudo o resto acresce. O Consumo público é uma parcela que contribui no aumento do PIB, e, a título de curiosidade, ultimamente em Portugal esta representa 50% (80 mil milhões de euros aprox.) de todo o PIB que o país cria.

1ª Dedução: Sempre que o Estado decide reduzir despesas está a contribuir para a redução do défice. Mas, se reduz despesas, forçosamente reduzirá o valor do Consumo Público, obrigando a uma redução no PIB. Ou seja, o que se ganhou na redução da despesa perde-se na redução do PIB.

2ª Dedução: Sempre que o Estado decide aumentar os impostos está a contribuir para a redução do défice. Mas, se aumenta impostos à população, forçosamente reduzirá o valor do Consumo Privado, já que a população possui menos dinheiro para gastar, investir ou poupar. E com isso o PIB também cairá, anulando o efeito positivo do aumento dos impostos. Como efeito secundário, o aumento de impostos significa maior fuga tributária, o que prejudica o PIB, já que neste não se considera o mercado "paralelo".

A única forma de sair deste ciclo vicioso é haver um incremento nas restantes parcelas do PIB - Investimento e Exportações - e uma redução nas Importações.
Infelizmente isto não ocorre do dia para a noite e nesta última década fomos retirando força relativa às exportações e ao investimento na totalidade do PIB.
É o Estado que influencia significativamente o valor do PIB, e neste momento essa influência é negativa.

Conclusão:
Por mais que o Estado tente reduzir despesas ou aumentar impostos, o défice dificilmente se reduzirá para valores próximo de zero, obrigando à emissão de mais dívida e ao aumento das despesas do Estado com os juros dessa mesma dívida. A este fenómeno podemos chamar de ciclo vicioso, de que dificilmente se sairá.

A agravar este ciclo vicioso, foram inscritas despesas nos défices de 2010 e 2009 que tiveram origem em anos anteriores, mas que, por contornos menos conhecidos, nunca foram inscritas na despesa pública. Um exemplo bem recente é o denominado "buraco" do Arquipélago da Madeira, que, por omissão no passado terá que ser inscrito agora, agravando os números da despesa, do défice e do valor da dívida total da República Portuguesa.

Fica o alerta: sempre que a classe política dirigente, economistas e "opinion makers" falarem em aumento da austeridade sem afectar o crescimento da economia, não lhes deêm crédito. Matematicamente falando, é quase impossível que tal ocorra.
 
Tiago Mestre

19 de setembro de 2011

Henrique Medina Carreira - Obrigado

Escrevo este post para felicitar o Fiscalista Henrique Medina Carreira que voltou a aparecer na televisão, desta vez acompanhado pela jornalista Judite de Sousa na TVI24.


Sendo eu um ávido telespectador dos filmes do Medina Carreira no YouTube, apraz-me registar que o pensamento do fiscalista continua vivo, lúcido e em confronto aberto com a sabedoria convencional que assistimos na espaço mediático português.


Pensar abertamente sobre a globalização e como os seus desenvolvimentos estão a prejudicar Portugal, a Europa e os EUA, através da desindustrialização massiva, é de louvar, deixando uma porta aberta para a reflexão sobre o (velho) proteccionismo.


Um bem haja para esta personalidade que tanto me influenciou, e que me ajudou a clarificar e a consolidar os princípios morais em que ainda acredito.


Tiago Mestre

16 de setembro de 2011

2º Post: A Energia (Renovável) somos nós

Pretendemos neste post dar conhecimento aos estimados leitores de uma notícia avançada hoje pelo edição online do Diário Económico, cito: "Regulador quer subir preço da electricidade em 30%."

As razões invocadas pelo regulador ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) prendem-se sobretudo no custo adicional que as Energias Renováveis estão a provocar na produção de energia eléctrica em Portugal.

E sobre este tema publicámos um post a 18 de Agosto que explica os motivos deste sobrecusto, que tão mal explicado foi aos portugueses durante estes últimos 5 anos.

A ERSE, como entidade reguladora, apenas sugere ao governo quais deverão ser as novas tarifas de electricidade para o próximo ano, tendo em conta todos os custos associados à produção, transporte e comercialização de energia eléctrica. Como até agora o custo adicional das renováveis estava a ser financiado com dívida, pouco se falava no assunto e não se reflectia nas tarifas, mas provavelmente essa fonte de financiamento esgotou como muitas outras em Portugal, e mais cedo ou mais tarde teríamos que ouvir a notícia de que a dívida que está para trás (ascende a 2 mil milhões euros) e os custos que sabemos que teremos no futuro terão ser pagos por alguém, restando apenas os consumidores - nós - para financiar tudo isto.

Há 6 anos atrás sensivelmente, o então presidente da ERSE - Eng. Jorge Vasconcelos, tentou imputar os custos das renováveis nas novas tarifas de electricidade para 2007, com um aumento de 15,7%,  tendo provocado a "ira" do então Ministro da Economia, Manuel Pinho, obrigando à demissão do próprio Jorge Vasconcelos a 15 Dezembro de 2006 e à introdução do tal mecanismo de "financiamento" deste custo das renováveis com recurso à emissão de dívida. Esta algum dia teria que ser paga, e assim a ERSE vê-se obrigada a propor um aumento médio de 30% para 2012, só para começar. Nos anos seguintes logo se verá. Esta proposta de aumento julgo não ter precedentes na nossa democracia.

Para que a ERSE proponha um aumento desta ordem de grandeza é porque não vê mesmo outra alternativa. Esperamos reacções do governo, nomeadamente se aceitarão o aumento proposto ou se tentarão "arranjar" soluções para massajar este peso adicional nos portugueses para 2012. 

Talvez as famílias que menos rendimentos declaram (algumas delas bem dentro da classe média/alta por via de fuga fiscal maciça) sejam bafejadas por um desconto, ao abrigo deste novo programa de perpetuação de indigência, denominado Plano de Emergência Social (PES).

Quando os políticos se focam em arranjar soluções de curto prazo para resolver problemas de muito longo prazo, normalmente a consequência imediata é um certo alívio do impacto na população no curto prazo, mas fica a promessa escondida e não declarada que mais tarde a factura será bem mais pesada, porque teremos que pagar os juros da dívida contraída e certamente custos adicionais de problemas não previstos, como foi o caso da construção de centrais térmicas e hidroeléctricas que obrigatoriamente têm que existir para complementar a produção eléctrica quando há falta de vento.


Tiago Mestre
Licenciado em Engenharia Electrotécnica e Computadores - Ramo de Sistemas de Energia - pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

12 de setembro de 2011

OPINIÃO: EUROPA - UNIÃO DE BANCOS / DESUNIÃO DE PAÍSES

Após a inibição de Estados soberanos como Portugal e a Grécia em se financiarem no mercado de capitais, entramos numa nova fase que aponta o alvo para os bancos que emprestaram dinheiro a estes Estados. Como a rede interbancária é global, os bancos dos países que faliram não serão os únicos visados, mas os bancos que emprestaram a esses bancos e que adquiriram dívida directamente aos Estados estão também na corda bamba.
Contudo, é legítimo perguntar porque razão os bancos internacionais sofrem tanto com o incumprimento de uma parte das dívidas de um só Estado de pequena dimensão? É que supostamente estes bancos possuem carteiras de activos de uma dimensão gigante, e não deveria ser o incumprimento de uma pequena parte da sua carteira de activos a promover uma derrocada geral.
Pois, mas infelizmente os bancos de grande dimensão possuem um pequeno/grande problema: são descapitalizados por natureza, e este post tenta explicar isso mesmo:
A carteira de activos de um grande banco inclui normalmente empréstimos a Estados (obrigações do Tesouro), investimentos em bolsa, empréstimos à habitação, crédito ao consumo, crédito às empresas e crédito a outros bancos. Para conseguirem financiar toda esta carteira de activos, só há duas grandes formas de obterem os fundos para tal:
1.                  Injecção de capital pelos accionistas;
2.                 Pedindo dinheiro emprestado a outros bancos e a instituições credoras (fundos de investimento, fundos de pensões, etc).
A primeira opção foi desde sempre a mais utilizada, contudo possui a limitação de os recursos financeiros ficarem sempre limitados à vontade dos accionistas. Mesmo que esteja à vista um óptimo negócio, se os accionistas não quiserem entrar com o dinheiro, perde-se o negócio.
A segunda opção só se massificou mais recentemente, talvez desde finais dos anos 90. O recurso ao crédito para financiar investimentos tornou-se a grande força de “alavancagem” que os bancos tiveram ao seu dispor. Isto foi possível com a queda das taxas de juro nos empréstimos que os bancos centrais dos países artificalmente concederam aos bancos. Sendo a taxa de juro um indicador do risco entre quem empresta e pede emprestado, a sua queda para valores próximo de zero significou que as barreiras ao crédito foram reduzidas a quase nada, e portanto os bancos podiam fazer muito bem o que entendessem com esse dinheiro “fácil”. E realmente fizeram o que bem entenderam: emprestaram dinheiro a quem não tinha condições de liquidar as dívidas nos prazos acordados. Como exemplos: o crédito subprime nos EUA e mais recentemente as obrigações do Tesouro de vários Estados, incluindo Portugal. Emprestou-se dinheiro de forma muito generosa sem se acautelar a liquidação desse mesmo empréstimo.
Esta "alavancagem" trouxe outro presente envenenado que se descurou durante anos, saber:
Os accionistas começaram a preferir em demasia pela segunda opção, em vez da primeira, e isso significou que os bancos ganharam dimensões enormes, mas à custa de pedir emprestado. Os capitais próprios tornaram-se uma mera fracção dos capitais emprestados. Aparentemente esta situação não apresenta problemas. Desde que os investimentos efectuados com esse dinheiro emprestado ofereçam lucro, ou seja, a diferença seja positiva entre o juro do crédito concedido e o juro do crédito que se contraiu para financiar esse empréstimo, tudo bem. Os accionistas ficam contentes porque receberão dividendos tendo investido pouco dinheiro e os directores receberão bónus chorudos porque a companhia apresentou uma performance muito positiva.
O problema ocorre quando esses investimentos começam a perder rentabilidade e/ou credibilidade junto dos mercados de capitais. Um caso evidente e bastante recente foi a emissão das obrigações de países que agravaram a sua credibilidade na emissão de dívida. Portugal, por exemplo, há 6 anos atrás, quando emitia dívida de 500 milhões de euros com 3 anos de maturidade, o valor facial dessas obrigações mantinha-se inalterado ao longo dos 3anos no mercado secundário, ou seja, os 500 milhões, e a taxa de juro não oscilava, fixando-se pelos 3% aproximadamente. Mais recentemente, quando Portugal emitia o mesmo montante, 500 milhões, com a mesma maturidade, 3 anos, e essas obrigações iam parar ao mercado secundário, este, desconfiado, começou a forçar cada vez mais a venda das obrigações a novos compradores, só que estes, desconfiados também, exigiam cada vez maiores taxas de juro para as comprarem. A taxa de juro serve sempre como um indicador de risco. Actualmente, o valor facial das obrigações portuguesas que circulam no mercado secundário é muito inferior aquando da sua emissão pelo Estado português, e as taxas de juros subiram para mais de quádruplo: de 3% passou para 12% ou mais.
Todos os bancos nacionais e internacionais que compraram estas obrigações no passado e não as venderam antes de se desvalorizarem ficaram com uma carteira de activos mais pobre, e para agravar a situação, caso se tenham endividado para as comprar, a tal “alavancagem”, poderão correr riscos de estarem a perder dinheiro com o negócio. Como cereja em cima do bolo, as leis europeias permitem que os bancos apresentem na sua carteira de activos o valor facial destas obrigações aquando da sua compra, mesmo que entretanto se tenham desvalorizado no mercado secundário. Isto significa que os bancos, basicamente, andam a mentir acerca dos activos que possuem no seu portefólio, reportando títulos de obrigações que há 6 anos valiam 500 milhões de euros e que agora só valem 450, mas continuam a aparecer com valor de 500.
E porquê esta dificuldade em reportar o valor real?
Em primeiro lugar significa que os bancos estão a perder valor neste investimento, em segundo o mercado de capitais e as agências de rating estão atentos a perdas, e terceiro a oficialização da queda do preço destes títulos agrava os rácios de solvência do banco, sobretudo quando este está excessivamente “alavancado”, a saber:
Imagine-se dois bancos, cada um com 100 mil euros em activos. O banco 1 financiou-se junto dos accionistas em 100% para conseguir investir os tais 100 mil euros em activos. O banco 2 financiou-se em 1% junto dos accionistas, mil euros, e os restantes 99% pediu emprestado ao exterior.
Se os activos dos 2 bancos tiverem um retorno líquido de 1% cada ao ano, significa que no banco 1 cada accionista recebe apenas 1% de dividendos, enquanto que no banco 2 cada accionista recebe 100% de dividendos. Foi por esta razão que os bancos cresceram muito por via da “alavancagem” no crédito.
Mas quando o mercado começa a declinar e a carteira de activos perde 1%, no banco 1 o accionista perde apenas 1%, mas no banco 2 o accionista perde 100%. Nesta situação, o banco 2 que tanto prosperara no passado recente, torna-se insolvente da noite para o dia. Os bancos mundiais infelizmente estão muito mais na condição do banco 2 do que do banco 1.
A título de exemplo, o gigante mundial Deutsche Bank possui um rácio de capitais próprios versus os seus activos de 1,9%, que é pouco mais do que 1%. A maior parte dos bancos de dimensão nacional andam actualmente pelos 7% a 8%, apesar de que ainda há pouco tempo roçavam os 5% e 6%, mas foram obrigados a capitalizar-se por imposições europeias e pelos acordos de Basileia.
É por estas razões e por outras que os políticos querem tanto proteger e capitalizar os bancos. Têm a noção da pobre capitalização dos mesmos e do efeito sistémico que se gera quando um destes bancos apresenta insolvência. Daqui decorre também a explicação pela qual há tanta vontade na Europa em resgatar os países que viram as suas dívidas soberanas colapsar no mercado secundário, como Portugal. As consequências de deixar um país entrar em incumprimento significaria que os bancos que detêm dívida desse país seriam automaticamente obrigados a reportar essa perda na sua carteira de activos, criando o tal efeito dominó de insolvências atrás de insolvências no sistema bancário.
Com todas as apreensões em torno do sistema bancário europeu desde Julho de 2011, os empréstimos a bancos europeus e entre bancos europeus tornaram-se mais escassos e com taxas de juro mais elevadas, como se confirma na taxa LIBOR para a Europa durante o mês de Agosto e já também em Setembro. Os bancos viram-se assim obrigados a pedir emprestado ao Banco Central Europeu como mecanismo de último recurso, com efeitos altamente negativos na sua credibilidade. É que a partir do momento que se sabe que banco x recorreu ao BCE, significa que está em apuros para obter financiamento no mercado interbancário normal.
Nas bolsas de valores onde estes grandes bancos estão cotados, os investidores já estão a antecipar eventuais insolvências ou resgates de grandes bancos europeus, livrando-se a qualquer preço das suas acções nas bolsas. Os títulos das acções têm caído sistematicamente, havendo ocasionalmente quedas diárias superiores a 7% e 8%. Muitos bancos estão a atingir cotações historicamente baixas.
E para terminar, as últimas notícias indicam que a Alemanha já se prepara para ajudar os bancos alemães que mais sofrerão com um incumprimento da Grécia, país que tem sido o balão de ensaio das políticas de resgate da União Europeia, mas que tão maus resultados tem demonstrado.
Tiago Mestre

6 de setembro de 2011

O MEU QUERIDO MÊS DE AGOSTO

Pretendemos neste post informar sobre o que se passou em Agosto de 2011 nas bolsas europeias e como esse fenómeno transpirará para Setembro e por aí em diante:


Durante o mês de Julho, as bolsas europeias e norte americanas travaram um ciclo de 2 anos de ganhos. Essa travagem não se ficou pela estagnação, e em inícios de Agosto as quedas em bolsa foram fortíssimas, com quedas diárias de 4% ou mais. Durante o mês de Agosto, as quedas bolsistas evaporaram os ganhos obtidos durante todo o primeiro semestre de 2011.
Com as quedas em bolsa, foram os títulos das bancos europeus que mais caíram, e novos rumores apareceram de que os bancos estariam com dificuldades em se financiarem entre eles. Esta informação foi confirmada com a publicação semanal do Banco Central Europeu, que refere um aumento sem precedentes nos empréstimos concedidos em euros a bancos europeus. 


Já no arranque do mês de Setembro, novas quedas nas bolsas europeias levaram os títulos para valores de há 2 anos, ou seja, toda a capitalização bolsista obtida em 2 anos de crescimento foi dissipada apenas num mês e pouco. 
É já evidente que os mercados se anteciparam aos problemas que os países europeus e as suas instituições bancárias irão viver nos próximos dias, sobretudo a Espanha, a Itália, os bancos italianos, franceses, belgas e alemães.


Nos Estados Unidos, o mês de Setembro ainda não foi catastrófico para as bolsas, contudo os receios de Agosto avolumam-se com os péssimos indicadores económicos que vêem a público, e existe um banco em concreto, o Bank of America, que está na linha de fogo, com desvalorizações sucessivas em bolsa e que poderá estar na iminência de pedir resgate financeiro.


Com o acumular de receios sobre eventuais fenómenos potencialmente catastróficos na economia mundial, as autoridades políticas e monetárias continuam a tentar aplicar paliativos na economia, no sector bancário e no mercado cambial. Estas políticas apenas atenuam a velocidade com que os receios mundiais crescem, nada mais. Os problemas estruturais avolumam-se, crescem com o passar dos dias, e qualquer evento parecido com uma insolvência bancária poderá atirar os níveis de receio para um pânico generalizado.


Quando esse momento chegar, quem ainda possuir investimentos a prazo ou dinheiro aplicado em contas bancárias com maturidades fixas verá dificuldades em resgatar esses investimentos. Quem possuir dinheiro em contas bancárias à ordem terá apenas a possibilidade de levantar uma percentagem do valor global. Serão os cidadãos que pouparam e fizeram o seu trabalho de casa que verão os seus rendimentos congelados. Ainda vão a tempo de se preparar para o inevitável, minimizando o risco para si e para os seus.


Quem está excessivamente endividado provavelmente não terá muito a perder, já que poderá com alguma probabilidade renunciar ao pagamento das dívidas sem grandes consequências, dado que os bancos estarão num stress enorme e sem meios para repor a normalidade.


Tiago Mestre