11 de julho de 2011

OPINIÃO: PORTUGAL POSSUI DIMENSÃO SUFICIENTE PARA SER... TAL E QUAL COMO FOI NO PASSADO

Pretendemos com este post informar os leitores das nossas convicções acerca do tipo de economia que melhor se enquadrará para Portugal, de acordo com as nossas possibilidades e capacidades.


De acordo com o nosso primeiro post, informámos os nossos leitores de que a economia portuguesa, como motor do progresso e desenvolvimento do país, tem vindo a cair sustentadamente desde os anos 60, situando-se no início desta nova década abaixo de zero, ou seja, em recessão. O ano de 2012 será também de recessão, augurando uma década que dificilmente será melhor do que a anterior.


Como forma de compensar o declínio económico do lado dos privados, o Estado português e a classe política foram incorporando funcionários nas estruturas públicas, criaram subsídios de várias naturezas, realizaram investimentos públicos em infra-estruturas, etc. Como prova disso mesmo, nos últimos 20 anos, o Produto Interno Bruto de Portugal cresceu a uma taxa média anual de 1,8% mas a despesa corrente primária cresceu 4,2% (fonte). Estes dados revelam que o caminho seguido foi o do endividamento público face ao declínio económico do lado privado. Como consequência, a dívida pública cresceu para valores que representam em 2011 100% do PIB (170 mil milhões de euros) aproximadamente. Com este crescimento da dívida e ausência de crescimento do PIB, mais cedo ou mais tarde os nossos credores perceberiam que a trajectória de endividamento teria que ser corrigida.

Chegámos ao ponto em que os credores privados deixaram de confiar na nossa capacidade de liquidar a dívida, pública e privada, consubstanciada nas quedas de avaliação que as agências de rating fazem periodicamente ao nosso país. Por nossa responsabilidade, os credores empurraram-nos para um beco sem saída, em que o cenário de ajuda via UE torna-se a única solução de “cara lavada”. Infelizmente esta ajuda está ferida de morte, não só pela análise defeituosa da nossa realidade, como pelo conteúdo da mesma, da sua operacionalização e dos resultados ambiciosos que pretendem, nomeadamente o crescimento económico do PIB português. 


Os factos e a realidade dizem-nos que chegaremos ao fim de 2013 com mais dívida pública, défice em percentagem do PIB ainda longe do “défice 0”, sector público emagrecido e uma economia privada profundamente recessiva, já que o sustento desta dita economia privada assenta muito no fornecimento de bens e serviços ao sector Estado. O peso do Estado em Portugal em 2010 representou 50% do PIB, ou seja, se o Estado “espirra”, a economia apanha uma constipação. A redução da despesa e o aumento de impostos que o Estado desespera em atingir não significará um espirro, mas uma grande constipação. No mínimo, isso provocará uma pneumonia na economia privada.


A economia privada só passaria imune ao emagrecimento do Estado se esta fosse pujante, com mais exportações do que importações, mais agricultura, mais indústria e um peso do Estado na economia muito inferior ao que é hoje.


E é exactamente na agricultura, e depois na indústria, que reside a única tábua de salvação a que os portugueses se podem agarrar nas próximas décadas. O sector dos serviços, que representa hoje 70% da população activa e também 70% do PIB (ver post de 31 Dezembro 2010), terá que ver a sua quota drasticamente reduzida. Só chegou a estes valores porque a economia de ilusão na obtenção de crédito e de consumo teve o seu apogeu na década que passou. Com o garrote na obtenção de crédito já fomos forçados a corrigir esta trajectória. A recessão económica em que estamos mergulhados confirma-o.

Sobre a agricultura em Portugal, é necessário compreender como ela era e como se foi transformando nas últimas décadas. 

Com a Política Agrícola Comum da União Europeia, passámos a regular de forma diferenciada as quotas de produção de certos produtos, a subsidiar de forma diferenciada produtores para não produzir e a subsidiar de forma diferenciada produtores para produzirem mais, a um preço de venda que não reflecte os custos da exploração. O problema dos mercados excessivamente regulados é que facilmente se tornam em mercados artificialmente manipulados, promovendo entorses e distorções que, mais cedo ou mais tarde, levam ao colapso do modelo subjacente. 


Na adaptação ao caso português, a história da nossa economia agrícola não foi tida em conta e julgou-se que estas transformações económicas e sociais seriam em benefício do progresso do país. Dever-se-ia ter percebido que a história da nossa economia agrícola foi essencialmente de carácter rural, com muitos minifúndios e poucos latifúndios. É característico da nossa cultura preservar o nosso espaço, ou por reserva de intimidade ou por invejas entre pares. Um exemplo característico é a forma como muramos as nossas propriedades, sobretudo nos meios mais rurais. Os latifúndios sempre foram locais de tensão social entre trabalhadores, que se consideravam explorados, e os patrões, que consideravam os trabalhadores como um meio (digno ou não), para se atingir determinado fim económico. Os latifúndios foram politicamente protegidos durante o período do Estado novo, em que a força das corporações, consubstanciada na Constituição de 1933, foi oficializada e posteriormente amplificada pelas forças da autoridade, com direito a repressão a quem se recusasse a trabalhar nas condições que lhes eram oferecidas. 


Com a revolução de 25 Abril de 1974, os latifúndios privados ficaram em posição desfavorável, muitos desapareceram com a imposição de novas ideologias e novas políticas, e apenas o minifúndio se manteve inalterado já que era de exploração familiar ou pessoal. A partir da década de 80, com a entrada de novas políticas europeias de regulação das quotas de produção agrícola, com a aceleração do fenómeno da globalização com a queda do preço do petróleo e a criação de enormes superfícies comerciais, com políticas de redução de preços e esmagamento de margens nos fornecedores, criaram-se as condições para o progressivo abandono da exploração da terra. Os minifúndios e os pequenos produtores agrícolas que até aí viam a sua produção ser comprada e escoada pelos retalhistas locais, e que inclusivamente chegavam a deslocar-se às propriedades dos agricultores pedindo-lhes para venderem tudo o que produziam, começaram a desaparecer. 


A entrada de produtos agrícolas estrangeiros produzidos em grande escala a preços impossíveis de combater pelos minifúndios ditou o aniquilamento deste modelo económico secular de produção, comércio e consumo regional de bens alimentares. Apenas as populações mais idosas e rurais mantiveram o hábito de cultivar a terra, mas apenas para consumo próprio.


Com a destruição da agricultura de pequena dimensão, também as indústrias que se baseavam na transformação desses mesmos produtos alimentares se foi reduzindo, já que a matéria-prima escasseava e a obtenção da mesma no exterior não as tornava competitivas. Casos como os lanifícios da Covilhã, dependentes da pastorícia na região, ou as indústrias de conserva junto aos portos de pesca, ou ainda as indústrias de cortumes, tendo como matéria prima as peles dos animais. Todavia, há exemplos positivos que contrariam a tendência, como são os casos da indústria do papel e do cimento, que se baseia na matéria-prima obtida/produzida em território nacional.


Foram estas actividades do sector primário que geraram durante décadas toda uma cadeia de valor que promovia crescimento económico, baixo desemprego, indústrias em grande quantidade e menor necessidade de importações.


Como prova deste declínio, em 2010 o sector agrícola representou um valor de 4 mil milhões de euros na economia, aproximadamente 2,3% do PIB, e a indústria aproximadamente 25%. Estas percentagens distanciam-se muito dos 60 a 70% que estes sectores representavam até à década de 70.


Inevitavelmente, o nosso nível de consumo terá que cair para o nosso nível de produção. E se o nosso nível de produção caiu durante estes últimos 40 anos, então a queda do nível de consumo será abissal. É que só nos foi possível aumentar o consumo e reduzir a produção porque nos endividávamos no exterior para compensar a diferença. Este modelo económico parece-nos totalmente esgotado, e só não colapsou há 1 ano porque o Banco Central Europeu financiou à pressa a actividade bancária e a dívida do Estado, quando os credores privados internacionais cessaram de o fazer. Muito mais recentemente, tivemos a União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Europeu a fornecerem mais um balão de oxigénio a uma economia anémica e de ilusão por um período adicional de 3 anos. Quanto mais tarde nos ajustarmos, mais doloroso será esse ajustamento. Só o aumento da produção agrícola e industrial, acompanhada da redução do sector terciário, nos permitirá inverter esta trajectória.

Tiago Mestre

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