Uma das alavancas fundamentais na manutenção e no progresso das economias ditas modernas prende-se com o constante fornecimento e a preços acessíveis de energia eléctrica e de energia térmica, sendo o gás natural para aquecimento e o petróleo para deslocações os recursos fósseis mais utilizados.
Neste post faremos uma abordagem sobre as recentes políticas energéticas em Portugal, com o foco nas energias renováveis.
Desde que o fornecimento de energia eléctrica surgiu em Portugal, e com o desenvolvimento das barragens hidroeléctricas a partir da década de 60, construímos toda uma rede de distribuição que produz a energia na origem (centrais eléctricas) e a entrega na outra ponta da rede, nos clientes finais. As centrais eléctricas espalhadas por Portugal recorrem sobretudo a recursos fósseis, com predominâncias quase total pelo Gás Natural e pelas Barragens Hidroeléctricas, recorrendo ao desnível natural dos rios.
Mais recentemente incorporaram-se no sistema de produção os equipamentos que recorrem a “matérias primas” renováveis, ou seja, que não se esgotam. A tecnologia mais utilizada recorre à energia do vento, designada energia eólica.
Com a introdução destas novas tecnologias no mercado, foi necessário tornar o modelo de negócio apelativo aos investidores, tendo o Estado decidido que os produtores desta energia eléctrica seriam subsidiados. Este subsídio é simples: os produtores de energias renováveis recebem um acréscimo no valor do kWhora acima do valor praticado pelos produtores de energia “convencional”. Contudo, esse acréscimo não é o Estado que subsidia, são os consumidores, através da factura que nos chega a casa. Síntese: a política de estímulo à produção de energia eléctrica renovável é paga pelos consumidores.
Contudo, desde 2007 que estes subsídios aos produtores cresceram para valores muito elevados, e mais uma vez o governo interferiu: para que a factura não pesasse excessivamente nos consumidores, estabeleceu-se um défice tarifário, com recurso a endividamento, em que o pagamento destes valores pelos consumidores fica em atraso até que o governo decida como e quando imputar estes custos. Este défice tem aumentado sucessivamente, e segundo os últimos dados, presume-se que ascenda a 2000 milhões de euros. (fonte)
Com a introdução de muitos produtores de energias renováveis no mercado, ficámos com “excesso” de produção eólica, e logo começaram a emergir outro tipo de problemas, a saber:
1. O vento sopra em Portugal em média 25% do tempo, e sobretudo durante a noite. Isto significa que quando não há vento, sobretudo durante o dia, é necessário que os restantes produtores de energia assegurem a produção em falta pelas eólicas. E durante a noite há excesso de produção que terá que ser escoada obrigatoriamente. A energia eléctrica não se pode armazenar: se é produzida, terá que ser consumida no imediato.
2. Face à circunstância de o vento soprar mais de noite do que de dia, Portugal foi obrigado a construir (comprar) mais centrais eléctricas que utilizam o gás natural como matéria-prima, bem como novas barragens hidroeléctricas. É preciso pagar a sua manutenção e a sua disponibilidade para que, em caso de não haver vento, entrem em produção.
3. Como atrás referido, o vento sopra sobretudo à noite, mas é nesses períodos que há menor consumo. A população está a dormir, o comércio e a indústria estão parados, e portanto não há consumidores. Como a energia eléctrica não se pode armazenar, arranjou-se outra solução de recurso para fazer face a este problema: construíram-se (compraram-se) soluções de bombeamento de água nas centrais hidroeléctricas, ou seja, durante a noite as bombas eléctricas instaladas consomem energia eléctrica das eólicas bombeando água novamente para cima da barragem, que foi usada durante o dia para produzir energia. Esta solução apenas atenua o problema do excesso de produção das eólicas durante a noite, já que a potência instalada destas bombas eléctricas é muito inferior à potência produzida pelas eólicas numa boa noite de vento.
4. Para complementar esta falta de potência instalada, muito recentemente estabeleceram-se políticas de incentivo à aquisição de carros eléctricos, que supostamente ficarão a consumir energia eléctrica durante a noite para recarregarem as baterias.
Estas políticas de crescimento orgânico, à medida que os problemas vão surgindo, colocam-nos as maiores reservas, sendo esta última de difícil concretização, já que para acomodar o aumento de consumo por via dos carros eléctricos na cidade é necessário rever toda a infraestrutura eléctrica e torná-la mais robusta, obrigando a maiores investimentos.
Para que estas políticas de energias renováveis sejam satisfatórias para os contribuintes, que são quem as paga mais cedo ou mais tarde, é necessário que haja benefícios, e os maiores de todos são a contribuição para um ambiente menos poluído e uma redução na factura da energia eléctrica.
Quanto ao primeiro benefício, é de acreditar que há efectivamente menos poluição na produção de energia eléctrica em Portugal, mas quanto ao segundo benefício, não há nenhuma informação/estímulo que nos induz a acreditar que a produção de energia eléctrica se revele mais barata por via da massificação das energias renováveis. Até ver, o pouco que se sabe é que somando todos os custos de investimento mais manutenção e exploração de todas as novas centrais eólicas, térmicas, hidroeléctricas, novas linhas eléctricas, subestações e grupos de bombeamento nas barragens, estes serão dificilmente inferiores ao que se evitou na compra de gás natural ao estrangeiro.
Exemplo: para instalar uma central eólica de 800 Megawatt de potência, terá que se construir também uma central térmica ou uma barragem com a mesma potência para compensar a eólica em caso de falta de vento, e já agora, uma central de bombeamento de água para as noites ventosas. Isto significa que é preciso investir muito dinheiro (talvez o triplo) para complementar as vicissitudes da energia eólica.
Acredito que a ideia de substituir a importação de recursos fósseis por produção com vento “nacional” é uma boa ideia, mas obriga a estudos de viabilidade para se perceber quanto custa, quem pagará e a que preço. Caso os estudos não tenham sido totalmente abrangentes, e a realidade venha a demonstrar outros resultados, o que é compreensível, exige-se aos governantes que falem dos erros de cálculo, do que não foi considerado inicialmente e dos desvios técnicos e financeiros que estão em causa, para que os portugueses possam, pelo menos, saber o que lhes espera.
Para já, o que se sabe é que pagamos mais na factura eléctrica devido ao estímulo que é dado aos produtores e que existe um desvio tarifário todos os anos que rondará os 500 milhões de euros ao ano. Tudo somado e totalizado ao longo dos anos é muito dinheiro e que não pode continuar na gaveta do esquecimento. Se os portugueses souberem, e deverão saber, que toda esta ronda de estímulos e desvios entre os cálculos e a realidade representarão um aumento na factura da electricidade de 30, 50 ou 100%, certamente que não gostarão de ouvir, mas quanto mais se adia, mais se avoluma o problema, e maiores serão as revoltas da população no futuro. Com estas políticas energéticas, podemos realmente afirmar que “A energia somos nós”.
Lamentamos a falta de informação pública sobre este assunto, e portanto poderemos incorrer em alguns lapsos ou até falta de rigor na informação apresentada, contudo, e numa perspectiva mais individual, cada um de nós deverá saber que pesa sob os nossos ombros mais uma dívida que está à espera de ser liquidada. Acreditamos que mais cedo ou mais tarde o governo terá que subir “brutalmente” o preço da electricidade, tendo iniciado já essa caminhada com o aumento do IVA no final deste ano nas facturas da electricidade e do gás. Isto significará maior dispêndio de dinheiro todos os meses, e por esse motivo, a redução de consumo energético por todos os métodos possíveis surge cada vez mais como uma opção inadiável aos portugueses, obrigando a uma regressão nas nossas conquistas civilizacionais e tecnológicas.
Tiago Mestre