Não obstante, e porque estou farto de ouvir as instituições a dizer uma coisa e passado 6 meses dizer outra coisa totalmente diferente, desafiei o Pedro Miguel a avançar com critérios e grandezas que pudessem influir na "construção" da NOSSA fórmula que preveja minimamente o PIB.
O Pedro abordou nos comentários anteriores duas questões que me parecem ser objeto de reflexão:
1º: Os juros da dívida soberana estiveram, e ainda estão em níveis altamente penalizadores para a nossa economia. Só recentemente é que as OT a 10 anos é que baixaram dos 8% no mercado secundário.
2º O cálculo do PIB deve ter em conta os ciclos económicos, tanto os curtos, como os longos.
Sobre a 1ª questão, quero acrescentar o seguinte:
Fui ao Banco de Portugal e ao Eurostat para fazer este lindo quadro:
Se repararem, desde 2007 que lutamos por algum crescimento, por muito pequeno que seja. Mas para que ele apareça, é preciso muita dívida nova:
Em 2008 o PIB cresceu 2664 milhões de euros face a 2007, mas para tal ocorrer, foi necessário gerar 42833 milhões de nova dívida em Portugal. O que dá um rácio de 1€ de crescimento para 16€ de nova dívida.
Em 2009 face a 2008, ano da grande recessão mundial, o PIB caiu 3479 milhões de euros e a nova dívida gerada ficou-se pelos 30315 milhões.
Em 2010 face a 2009, o PIB cresceu 4166 e a dívida aumentou 34490. 1€ de crescimento para 8€ de nova dívida.
Em 2011 face a 2010, o PIB caiu 1655 e a nova dívida ficou-se pelos 24871.
Se fizermos o estudo a 4 anos (2008-2011), para o PIB crescer 1696 milhões, a dívida emitida foi de 132 509 milhões. 1€ de crescimento para 78€ de endividamento !!!
Onde é que eu quero chegar?
Nos anos em que a emissão de nova dívida foi inferior a 32-34 mil milhões, o país foi empurrado para a recessão.
Pedro e restante pessoal, poderemos usar este indicador para afirmar o seguinte enunciado?
- Sempre que a nova dívida contraída em Portugal for inferior a 32-35 mil milhões ao ano, o país entrará em recessão com a maior das probabilidades.
Para 2012, Portugal irá dar um grande trambolhão como sabemos: 3% de recessão, sendo que a OCDE estima que seja de 3,2% (fui ver depois no outro dia).
E de acordo com os dados do Banco de Portugal, disponíveis até Julho de 2012, a dívida total contraída ia em 730 mil milhões. Eu estimei que até Dez chegará aos 740 mil milhões.
Usando estes valores estimados, em 2012 a nova dívida contraída será só! de 20143 milhões, muito abaixo dos 32-35 mil milhões. Recessão garantida de 3%
Pergunta:
Como poderíamos usar estes dados, e outros que me estejam a escapar, para tentar perceber como será a emissão de dívida em Portugal em 2013, e com isso tentar dar um "tiro" na projeção do PIB?
Sabemos que o BCE tudo fará para que a taxa de juro média baixe. As OT a 10 anos já estão abaixo dos 8%. E segundo o BdP, e que pus no quadro, o juro médio em 2012 já anda pelos 3,69%, quando em 2011 andava pelos 4,28%. Será que teremos em 2013 um regresso dos juros a valores a rondar os 2-3% ?
Terá Portugal alguma folga no Estado, nas organizações e nas famílias para se endividarem um pouco mais? Será que é isso que irá acontecer? E em que valores?
Se os dados do BdP estão certos, a dívida total em Julho já vai em 730 mil milhões de euros, o que dará em 2012 um lindo rácio de 442% do PIB. Terei que alterar estes dados na barra lateral das Contas Nacionais.
Penso que com um rácio destes, em que a economia está totalmente contaminada pela emissão de nova dívida para crescer qq coisa, entrámos em território totalmente desconhecido e difícil de ser interpretado corretamente por modelos de previsão convencionais.
Sobre os ciclos económicos não vi nada.
Link para consultar estes dados, e mais, muito mais:
Boletim Estatístico Setembro 2012:
Os ficheiros Excel estão no capítulo K "Endividamento do setor não-financeiro"
Tiago Mestre
6 comentários:
Muito interessante o teu estudo Tiago.
Eu tinha noção desse artificialismo mas nunca me tinha deparado com a evidência dos números.
E apelidava a esse tipo de crescimento à la Sócrates,
" O crescimento de salto alto"...
Tiago, durante o fim de semana vou tentar juntar alguns dados, mas ainda não tive muito tempo para parar.
Sinceramente não te consigo afirmar nada sobre valores de dívida para a economia crescer.
A questão para mim é que dívida é essa.
A dívida não é necessariamente má, mau é os encargos da dívida serem incomportáveis.
Isso é válido para famílias, empresas e Estado.
O mal principal desta crise, é que o financiamento não chega às empresas.
O valor das OTs "pouco importam" pois são no mercado secundário e o estado financia-se em mercado primário (diga-se de passagem a taxas "normais" neste momento). O problema é essas taxas do mercado secundário medem o interesse global de investir no país, se a taxa é alta, a liquidez é baixa e pressiona o valor no mercado primário, mas, a taxa alta sinaliza risco alto e dificulta o acesso ao crédito pelas empresas, porque risco alto leva a spread alto (encargos incomportáveis).
A descida do défice sinaliza ao mercado a descida do risco e baixa o spread ao financiamento das empresas. É daí que pode vir o crescimento do emprego no médio prazo.
O que sufocou o sistema bancário português e facilidade de financiamento da economia?
Se bem se lembram foram os bancos que "pediram" a troika.
O governo de Sócrates, depois de avisar que OTs 10 anos acima de 7% significavam o recurso ao FMI, resistiu e obrigou os bancos nacionais a comprar a dívida pública. Isso foi um desvio de fundos da economia para o Estado, para financiar gorduras e não para produzir, sendo a machadada no tecido produtivo.
No dia que os bancos disseram NÃO, o governo chamou a Troika.
Foi tarde, uns meses antes e tudo seria mais fácil.
Só um ano e meio depois estamos a recuperar esse financiamento, basta ver que várias empresas conseguiram emitir milhões em obrigações neste último mês.
Aliás, acredito que após a aprovação do OE2013 e pedido de resgate espanhol, as OTs10 anos descem dos 7% de forma consistente.
Só por si, esse movimento vai fazer alterar as previsões da economia, não esquecer que o OE é uma previsão com base em previsões.
Sabemos que no país se o governo quiser absorver o dinheiro, o faz, por isso é ainda mais importante emagrecer o estado para que a economia possa ter acesso ao financiamento necessário.
É a economia que faz crescer o PIB, o estado só "sabe" intervir em desequilíbrios e legislar... se o fizer bem dá condições de crescimento à economia.
O crescimento e o valor como vamos crescer em 2013 vai depender de duas variáveis: as empresas vão conseguir financiar-se? as exportações vão aumentar?
Em suma, e corendo o risco de ter tido algumas imprecisões, a questão da dívida é saber nas mãos de quem está... se vai para o estado é para investir em custos fixos futuros, se vai para as empresas é para investir, para inovar, para criar PIB.
Pedro, achas mesmo que se o financiamento estiver mais disponível para o ano haverá privados e empresários a quererem ir buscá-lo para investir de forma reprodutiva e com isso fazer crescer o PIB?
Eu acho que se contraírem crédito, será mais para pagar juros e manterem-se à tona de água.
E como pode ser sustentável ter que gerar 20, 30 ou 70 unidades de dívida para criar uma unidade de riqueza?
Crescimento a que custo?
É que mais cedo ou mais tarde os juros comem tudo e não deixam nada.
Como estaria a economia portuguesa daqui a 20 anos se continuasse nesta trajetória?
Segundo o BdP, a dívida das empresas ascendia a 271 mil milhões em Dez 2007, e agora, Jul2012, é de 308 mil milhões.
Desde Set 2010 que esta dívida praticamente estagnou: entre 304 mil e 308 mil. Isto significa que as empresas começaram pelo menos a pagar os juros sem recorrer a mais dívida. Falta liquidar o capital, o monstro, e suspeito que com a destruição que está em curso na economia, a dívida nas empresas começará a cair.
Fiz isso na minha empresa, ao alocar 100% dos lucros para a redução do endividamento e do passivo.
Se a dívida das empresas rondasse os 30 a 40% do PIB, aí a história era outra, mas 186% do PIB?
E se juntarmos os privados, que também influenciam a economia, temos que acrescentar mais 170 mil milhões de dívida, apesar de que estes já vêm em trajetória descendente desde Dez2010, mês em que a dívida atingiu o pico dos 179 mil milhões.
Só mesmo o Estado e as suas empresas deficitárias, como a CP, é que continuam a fazer crescer a dívida à bruta, mas até estes estão comprometidos a baixar por causa da troika.
É que para haver mais crédito para a economia, é necessário tirá-lo do setor público, já que o bolo de dívida é com certeza finito.
E mesmo que haja crédito para distribuir, haverá gente suficiente a querer contraí-lo?
Estou confuso se o desmame no crédito é mais do lado do receio em contrair ou na dificuldade/custo em obter.
Que achas?
Desde Setembro de 2010 a dívida parou de crescer porque, tal como expliquei acima, o acesso parou.
A questão principal é que dívida?
Em primeiro lugar se uma empresa perde a viabilidade, pode/deve falir, mas no estado essa hipótese é catastrófica.
Não será portanto tão grave o endividamento alto de um conjunto alargado de empresas.
Em segundo lugar, qual é a produtividade dessa dívida?
Dois exemplos completamente em bruto:
1.000 milhões de euros investidas pelo estado na parque escolar
- totalmente gastos em Portugal, bens, serviços, tudo o associado é gasto em Portugal (é só um exemplo pq nunca é assim)
- resultado, mil milhões de euros para o PIB no ano de investimento, que desaparece quase na totalidade no segundo ano, mas aumentou a dívida e aumentou os custos fixos anuais.
1.000 milhões de euros investidos pela Galp na reconversão de Sines
- maquinaria toda importada, trabalho também (mais uma vez é um exemplo não real nesta parte.
- resultado é zero no PIB se pensarmos 1000 milhões de investimento mas - 1000 milhões por importação.
Contudo, a partir do primeiro ano, esse investimento vai gerar 500 milhões de euros para balança comercial e PIB.
Nenhum dos dois investimentos seriam possíveis sem crédito. O crédito contraído pela Galp é altamente rentável, mas foi possível porque foi negociado pré crise, se o fosse tentar agora, seria mais complicado conseguir.
É preciso redefinir onde queremos Estado, para que o Estado não absorva a economia, quer em burocracia, ineficiência ou financiamento.
Quanto às previsões do PIB, ainda não tive mesmo tempo, mas posso tentar simplificar algumas variáveis:
Consumo privado => diminui com menor rendimento disponível, diminui com o aumento da taxa de poupança, diminui com o aumento de preços
Consumo público => diminui de forma provisional tal como se pode ver no OE.
Investimento => diminui com dificuldade de crédito e irá diminuir com expectativas para a economia
Importações => influenciado por Consumo privado, público e Investimento. De certa forma dilui um pouco os malefícios de descida do consumo público pois em Portugal a maioria de carros e electrodomésticos são importados. Também são influenciadas, quando extra comunitárias, pela taxa de câmbio. E são influenciadas pelo preço do petróleo.
Exportações => Câmbio quando para fora da zona euro, aumenta em períodos de crise porque é preciso alargar o mercado. Aumenta com base no crescimento dos nossos clientes.
Por isso podemos ver:
tendência descida consumo
previsão de corte no consumo público
tendência descida de investimento
tendência de descuida de importações
tendência de câmbio com o dólar
tendência preço petróleo
crescimento dos nossos principais clientes.
É impossível chegar a um valor preciso, mas podemos conseguir um previsão com base em previsões.
Não podemos esquecer que mesmo o OE não passa de um exercício de "advinhação" com base em previsões.
Temos que encontrar os valores das cinco parcelas do PIB dos últimos 10, 15 anos, 20 anos. Mas onde?
Aqui temos pelo menos 12 anos:
http://www.pordata.pt/Subtema/Portugal/Investimento+e+Consumo-71
Tenho ideia que também havia nas séries longas do banco de portugal.
A ver se encontro.
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